terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Resenha de UM parágrafo sobre "AQUAMAN"!


Passado mais de um ano desde o fracasso retumbante de Liga da Justiça entre o público e a crítica, a DC reencontra o caminho com seu herói mais zombado em todo imaginário popular. Abusando das cores como até então não visto em todo este universo cinematográfico, Aquaman apresenta uma mescla de epopeia com aventura (que flerta com uma pitada de tosquice e breguice de tons quase verhoevianos) aliado a ricas criações de monstros e cenários através de um competente CGI, algo raro de se ver nos filmes de herói atualmente. Embora o ar romântico principal não funcione como o esperado, todo o resto se mostra bem azeitado, com Jason Momoa esbanjando carisma no papel principal e protagonizando cenas de ação estilizadas ao lado de seus companheiros de elenco (com Nicole Kidman, Patrick Wilson e Amber Heard surpreendendo em um terreno que está longe de suas zonas de conforto). Tudo isso é embalado por uma boa seleção de músicas e a estilizada trilha sonora de Rupert Gregson-Williams até o fim, que soa um pouco vago, mas não prejudica a experiência. 

TRAILER:


quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

5 álbuns do segundo semestre de 2018 que você deveria ter ouvido


Primeiro de tudo, quero que você olhe com atenção para a imagem que abre o post. Sério, olha que coisinha mais fofa, sorrindo, ouvindo uma musiquinha em headphones que possivelmente tem metade do seu tamanho. São cenas, momentos como este que, por menores que pareçam, fazem a vida realmente valer a pena.

Agora que eu já tornei seu dia um pouco melhor, é hora de dar continuidade às postagens de final de ano por aqui. Depois de conhecer alguns trabalhos lançados nos primeiros seis meses deste ano que não poderiam ter passar despercebidos, agora é hora de ver outros belos registros da atual metade de 2018 que também merecem sua atenção. Lembrando que as regras permanecem as mesmas do primeiro post (sem classificação por qualidade, apesar menção em ordem alfabética dos nomes dos artistas e grupos), que a lista de melhores será divulgada no dia 19/12 e que você talvez já tenha entrado em contato com eles caso acompanhe o Balanço Musical.

Confira, então, quais são os 5 álbuns do segundo semestre de 2018 que você deveria ter ouvido:

DEE SNIDER - FOR THE LOVE OF METAL


Mais conhecido pelo trabalho desenvolvido a frente da icônica (e farofeira) banda Twisted Sister, a mais recente empreitada de Dee Snider em sua carreira solo vai por uma vertente que poucos sabem, mas já foi muito explorada por ele em outros projetos: o Metal. Só que ao invés de tentar repetir qualquer fórmula do passado, o vocalista olha adiante e apresenta um som contemporâneo, ágil, forte e agressivo, o que faz de For the Love of Metal, ao mesmo tempo, um atropelamento por um caminhão monstro e uma carta de amor ao estilo.

GRETA VAN FLEET - ANTHEM OF THE PEACEFUL ARMY


Após deixar o mundo todo surpreso com a sonoridade extremamente semelhante à do Led Zeppelin em seu EP From The Fires, o Greta Van Fleet (que estará no próximo Lollapalooza) apresentou seu primeiro registro completo ao mundo neste ano. A influência de grupos clássicos, principalmente o já citado Led Zeppelin, é nítida, mas uma roupagem moderna e acessível, aliada à competência dos músicos, mostra que a banda é muito mais do que um mero cover, dando claros sinais de que ainda pode crescer muito e encontrar sua própria voz. Uma estreia que serve como um cartão de visita com um aviso escrito: o mundo precisa prestar atenção no quarteto nos próximos anos, pois tudo indica que eles se tornarão um dos principais nomes do Rock contemporâneo.

MUSE - SIMULATION THEORY


O Muse é uma banda inquieta, que gosta de realizar experimentações, e não é de hoje que eles vem flertando com sonoridades mais eletrônicas. Embora Drones indicasse que este caminho seria deixado de lado e as raízes do grupo voltariam a tona, Simulation Theory deixou claro que não é possível prever as escolhas do trio inglês, que abraça de vez o Eletrônico, o Synthpop e até flerta com passagens típicas da New Wave oitentista. É um trabalho agradável e divertido de se ouvir, e que revela uma nova camada ao se analisar as letras de suas músicas com atenção. Só não espere escutar muito do Rock antes apresentado por eles aqui.

NITA STRAUSS - CONTROLLED CHAOS


Nita Strauss despontou como integrante do tributo The Iron Maidens, tornou-se a guitarrista titular da banda de Alice Cooper e conquistou reconhecimento e prestígio ao longo dos anos. Dona de uma habilidade invejável e muita técnica, fez sua estreia como artista solo neste ano, em um trabalho instrumental. Além das características já citadas, Controlled Chaos evidencia toda a versatilidade da artista, que varia entre pedradas ágeis e timbres limpos repletos de feeling entre suas faixas de forma orgânica e prazerosa de se ouvir. Um bom início que faz jus à reputação de um dos principais nomes do instrumento na atualidade.

SLASH FEAT. MYLES KENNEDY AND THE CONSPIRATORS - LIVING THE DREAM


Não é segredo para ninguém que Slash segue sendo um dos principais e mais badalados nomes do Rock, e não é para menos: igual a uísque, parece que o homem vai apenas melhorando com o passar dos anos, refinando sua técnica e criatividade, sempre cercado de gente talentosa, como é o caso de Myles Kennedy e os Conspirators. E Living The Dream é a coroação desta parceria, que corrige os excessos (principalmente de duração) cometidos em World On Fire e entrega um disco mais ágil, diversificado e que empolga. Não há dúvidas que que o guitarrista está vivendo sua melhor e mais prolífica fase, e seu mais recente álbum é a prova concreta disto.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

5 álbuns do primeiro semestre de 2018 que você deveria ter ouvido


Chegou aquela época mais uma vez: o fim de ano. É o momento de ponderação, reflexão, confraternização e o encontro com amigos, colegas e parentes nos mais variados tipos de festa. Há quem celebre o fim de mais um ciclo, enquanto outros relembram os bons momentos dos 365 dias que se passaram. O fato é que cada pessoa encara o período de uma forma diferente, dependendo de suas experiências de vida e memórias que evocam sentimentos de festividades pregressas, mas uma coisa, acredito eu, é comum para todos: sempre é um alívio poder ver mais um ano chegar ao fim enquanto outro começa, independente das dificuldades enfrentadas, das alegrias vivenciadas, das derrotas, das vitórias. Você ainda está vivo, afinal, e esta é sua maior vitória neste mundo.

O final do ano também é o momento em que começam a ser divulgadas inúmeras listas pelos mais variados veículos de comunicação, especialmente pelos focados em música e entretenimento que, até o momento desta postagem, já soltaram as suas e encheram a vida dos entusiastas com descobertas e recomendações. Então, chegou a hora de eu soltar as minhas também. Seguindo o que estabeleci em 2017, farei três postagens: esta, falando sobre alguns bons álbuns que foram lançados durante o primeiro semestre; outra sobre bons álbuns que saíram neste segundo semestre e que deve estar no ar ainda nesta semana; e, por fim, o tradicional melhores do ano, que planejo postar no dia 19.

Lembrando que estas duas primeiras postagens não possuem critérios de classificação, são apenas exposições sobre os trabalhos em ordem alfabética conforme os artistas. Além disso, elas não devem ser nenhuma surpresa caso você tenha acompanhado as postagens da minha coluna mensal Balanço Musical durante o ano, nas quais falei um pouco sobre todos os discos lançados neste ano que ouvi, o que inclui aqueles presentes aqui. De qualquer modo, nunca é demais reforçar recomendações, especialmente quando se trata de boa música.

Sem mais delongas, confira quais são esses 5 álbuns do primeiro semestre de 2018 que você deveria ter ouvido:

ALIEN WEAPONRY - TŪ


O Alien Weaponry é um grupo formado por três jovens neozelandeses descendentes dos Maori, os povos nativos da região, que carregam tradições muito únicas como o haka (seus cânticos de guerra), popularizado mundialmente pelo time de rúgbi do país. O que o trio faz em , seu trabalho de estreia, é unir estes ritmos e linguajares tribais com o Metal, em um caminho semelhante ao que foi feito pelo Sepultura com a música indígena brasileira em seus mais consagrados álbuns. O resultado é forte, pesado e criativo, com os estilos sendo combinados de um modo bem funcional. Um início com o pé direito para uma banda que devemos prestar atenção no futuro.

ARCTIC MONKEYS - TRANQUILITY BASE HOTEL & CASINO


Após 5 anos desde o lançamento de AM, que botou os indies de Sheffield no mainstream de forma definitiva, o Arctic Monkeys retornou aos estúdios e trouxe à luz seu mais recente lançamento. E ele não é nada que os fãs esperavam. Composto inteiramente por Alex Turner (no que poderia muito bem ser um álbum solo do vocalista), deixa de lado o apelo Pop dos trabalhos anteriores e traz uma sonoridade rebuscada, que na maior parte do tempo se distancia quase que por completo do Rock, além de temáticas complexas em suas letras, como ficção científica e críticas sociais. É um registro pouco acessível e que fez muita gente reclamar e xingá-lo, mas é indiscutível o cuidado com os arranjos e a produção, além da coragem da banda em dar tal guinada em sua carreira, experimentando outros caminhos. Não é um disco para se ouvir a qualquer momento, mas é bem recompensador quando há disposição para escutá-lo.

CAMILA CABELLO - CAMILA


Camila Cabello saiu do Fifth Harmony para buscar uma carreira solo. Não cabe a mim julgar se a decisão da artista foi correta ou não, mas seu primeiro trabalho longe de seu antigo grupo já fez por valer a pena. Camila apresenta a cantora confortável sendo o centro das atenções, esbanjando todo seu talento vocal através de composições que mesclam a música Pop com influências de ritmos latinos, algo explícito em seu maior sucesso, a canção Havanna. Uma audição agradável que me surpreendeu logo nos primeiros dias de 2018.

ELISE LEGROW - PLAYING CHESS


Belo, sutil, refinado. Estes são apenas alguns dos adjetivos que podem ser usados para descrever o último álbum lançado pela pouco conhecida cantora canadense Elise LeGrow, que combina sua voz única e pouco convencional a uma mescla de Pop,  Jazz e  Blues que, através de 11 ágeis faixas, conquista o ouvinte e faz com que ele revisite Playing Chess algumas vezes, tamanho o encanto que o resultado final causa. Um bom exemplo de combinação funcional de um som sofisticado que consegue ser acessível ao mesmo tempo.

SHAME - SONGS OF PRAISE


Lançado em janeiro de 2018, este álbum foi bradado aos ventos pela NME e outras publicações especializadas britânicas como a mais nova "salvação do Rock". Um exagero, convenhamos, mas o trabalho de estreia do Shame tem sim muitas qualidades. Apostando em um som que resgata muitos aspectos do Post-Punk oitentista (e em alguns momentos ecoa o clássico Entertainment! do Gang of Four), é um disco cheio de energia e algumas experimentações aliadas a um tempero mais Pop que são suficientes para cativar qualquer um que o ouça. Não irá salvar um gênero que nem sequer precisa ser salvo, mas é uma boa adição a seus representantes, com a banda podendo surpreender bastante em seus vindouros lançamentos.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

BALANÇO MUSICAL - Novembro de 2018


Olá! Seja bem-vindo ao meu projeto Balanço Musical, uma coluna mensal na qual falo sobre música, o que escutei no mês que se passou, o porquê das escolhas, o que me influenciou nesses dias, e publico uma playlist com uma faixa referente a cada dia do período. O objetivo não é nada além de escrever um pouco mais sobre música no blog, apresentar algumas coisas diferentes e dar às pessoas a oportunidade de conhecer novos artistas e canções. As postagens são publicadas sempre no primeiro dia útil de cada mês, o que pode ou não coincidir com o dia 1º.

"Fuck my life". É neste clima alegre e de puro alto-astral que inicio a coluna desta vez. Novembro foi tão ruim (se não pior) que os meses que o antecederam, dando continuidade à minha inexplicável maré de azar que já perdura ao longo de todo este ano (e não é como se minha vida antes fosse um mar de rosas). É uma daquelas situações que parecem não ter saída, não importa o quão otimista você se mantenha, quanta esperança você cultive: no fim, estes sentimentos parecem te trair e piorar tudo a seu redor quando nada acontece da forma que você espera, ou ao menos de uma maneira minimamente aceitável. Claro, há momentos bons, mas os ruins são tantos que mal dá para aproveitá-los de uma forma digna.

Feito o desabafo, é hora de falar de música. E acho impressionante o quão diametralmente oposto este aspecto da minha vida está sendo de todo o resto durante 2018. Os últimos meses foram recheados de contato com alguns ótimos discos e artistas de destaque durante o ano, e este não foi diferente, inclusive sendo o que mais consegui ouvir trabalhos lançados recentemente (e que estarão presentes nas postagens de melhores do ano que sairão nos próximos dias). Fora, claro, a constante audição e redescoberta de clássicos, artistas renomados e álbuns ou canções que marcaram minha vida em diferentes épocas e que, como um pequeno lembrete da beleza da vida através das mais simples das coisas, sempre parecem ganhar novos significados através do momento ou do estado de espírito em que você se encontra.

Quando se trata de números, novembro repete a tendência (talvez autoimposta) de outubro e apresenta uma queda no meu consumo de música. Segundo meu last.fm, foram "apenas" 2.037 scrobbles, 308 a menos do que no mês anterior. Ainda é muito, de fato, especialmente se comparado com o começo do ano ou, principalmente, 2017, quando os números eram bem mais modestos (provavelmente porque eu estava bem mais ocupado), mas ao menos denota algum tipo de mudança de hábito (ou uma tentativa, que seja). De qualquer forma, não foi o suficiente para me impedir de bater meu recorde de reproduções em um único dia, que atingiu as 142 no dia 21 (era de 132 até então, atingido em agosto). Fora estes, vale ressaltar também que 508 artistas, 740 álbuns e 1.519 faixas diferentes fizeram parte dos últimos 30 dias.

E como é de se imaginar, muitos desses materiais merecem ganhar um espaço por aqui, tamanha suas qualidades e diferenciais. Por isso, hora de deixar a amargura de lado e se deliciar com os DESTAQUES DO MÊS, que podem ser conferidos a seguir.

ARTISTAS DO MÊS:

- Queen: graças ao lançamento de Bohemian Rhapsody, filme que retrata a trajetória do grupo até a apresentação no Live Aid em 1985, o grupo acabou por se tornar parte essencial do último mês. Não que seja necessária qualquer desculpa para ouvir uma das maiores bandas que já passou pela Terra, porém.

- The Beatles: o lançamento da edição de colecionador do disco homônimo (o famigerado Álbum Branco ou The White Album) somado à louca vontade que sinto de tempos em tempos de reouvir vários dos lançamentos da banda em sequência os fazem ganhar espaço novamente por aqui. Mas, novamente, não é necessária nenhuma desculpa ou ocasião especial para ouvi-los.

- a-ha: e falando em vontades loucas... Não sei, mas simplesmente não pude resistir à tentação de ouvir Cry Wolf e alguns outros sucessos do grupo pela milésima vez. Mas vale a pena, pois eles são um grupo como poucos (e infelizmente são muito subestimados).

ÁLBUNS DO MÊS:

- Black Stone Cherry - Family Tree (2018): sabe uma daquelas bandas que você já ouviu falar, tem vontade de conhecer, mas nunca sabe por onde começar? Esse era o Black Stone Cherry para mim. Felizmente soube que eles lançaram um disco neste ano e achei que seria a oportunidade ideal para conferir seu trabalho. E não me decepcionei, pois Family Tree é um disco forte, com composições que remetem àquilo que há de mais fino no Hard Rock, sabendo dosar sua intensidade e demonstrar suas influências.

- Blackberry Smoke - Find a Light (2018): o mesmo que eu disse acima é aplicável aqui também, inclusive quanto ao resultado. A principal diferença é que dá para sentir uma influência mais forte do Southern Rock e do Country no som do Blackberry Smoke, o que faz sua sonoridade mais distinta de demais bandas do gênero e torna o registro prazeroso de se ouvir.

- Turbonegro - RockNRoll Machine (2018): suas letras podem ser estranhas, enquanto suas temáticas podem ser controversas, mas é inegável que suas músicas são boas. O Turbonegro (outro grupo que se encaixa nos que eu disse sobre os dois acima) apresenta uma proposta interessante em seu mais recente trabalho, reproduzindo o Post-Punk com ares de modernidade, mas sem largar mão de elementos nostálgicos que consagraram o estilo em sua gênese.

- Muse - Simulation Theory (2018): discos do Muse sempre são, por algum motivo, um pouco mais difíceis para eu assimilar, e o resultado só passa a fazer sentido com o passar do tempo e algumas audições. Até agora, posso dizer que gostei de Simulation Theory, que possui bons momentos, mas que se afasta de vez do Rock e abraça algo com que o grupo já flerta há muito tempo: o Pop Eletrônico. O sentimento que fica é que o álbum deve ser ouvido de forma descompromissada tal qual um filme oitentista de Sessão da Tarde (alvo evocado pela capa).

- Jeff Goldblum & The Mildred Snitzer Orchestra - The Capitol Studios Sessions (2018): quando, em toda minha vida, eu iria imaginar que ouviria um CD do Jeff Goldblum tocando Jazz? E o pior de tudo é que o resultado é ótimo! Composto de covers de alguns clássicos do estilo e contando com a participação de alguns nomes famosos e até inesperados (como a atriz e comediante Sarah Silverman), é uma audição agradável do início ao fim e uma boa porte de entrada ao gênero.

- Joe Bonamassa - Redemption (2018): o guitarrista e bluesman já havia marcado presença por aqui em setembro com seu mais recente trabalho de covers ao lado de Beth Hart, Black Coffee, e agora retorna com um trabalho que recheado de bons momentos e que consegue conversar com o lado emocional do ouvinte como poucos. Um verdadeiro deleite do início ao fim.

- Stormwitch - Bound to the Witch (2018): confesso que não foi um disco que me impactou em sua primeira audição, uma segunda chance a ele foi mais que o suficiente para me cativar. O competente som do grupo mescla o Hard Rock com algumas pitadas de Judas Priest e o resultado de seu mais recente registro agrada qualquer um que esteja procurando por um som direto, que remeta aos clássicos, sem reinventar a roda.

- The Struts - Young & Dangerous (2018): fui apresentado ao grupo através da alcunha colocada por alguns veículos de mídia como este sendo o "novo Queen". É inegável que há influência dos britânicos em sua sonoridade mas, ao menos para mim, é um resultado que se distancia bastante de qualquer coisa que Freddie Mercury e cia. tenham feito ao longo de sua carreira. Ainda assim, é um trabalho bem sólido e agradável, traduzido em um Pop Rock que sabe balancear o moderno com o clássico.

- Voodoo Circle - Raised on Rock (2018): um álbum que me impressionou do início ao fim desde sua primeira escutada. Forte e cirúrgico, é certamente uma das audições mais completas com que tive contato ao longo do ano, com um equilíbrio entre o peso e a melodia que beira a perfeição. Merece sua atenção, sem dúvidas.

- Thundermother - Thundermother (2018): este autointitulado é na verdade o terceiro disco desta banda exclusivamente feminina. As garotas fazem um som voltado ao Hard Rock que não fica devendo em nada para grandes nomes do estilo, inclusive lembrando o Halestorm em determinados momentos. Outro que vale a pena conhecer.

- Nita Strauss - Controlled Chaos (2018): o primeiro trabalho solo da guitarrista da banda de Alice Cooper, além de integrante do grupo cover The Iron Maidens, coloca todo seu talento em evidência, em composições que variam entre a agressividade e a calmaria e deixam clara toda sua habilidade e técnica. Um caos controlado, como diz seu próprio título, tal qual a vida.

- Mumford & Sons - Delta (2018): gosto bastante de Wilder Mind, de 2015, então a expectativa para este novo trabalho do grupo era um tanto elevada. Mas Delta soa morno, pasteurizado, até mesmo sem alma, com elementos consagrados da sonoridade do Mumford & Sons sacrificados na tentativa de fazer algo que possa ser acessível a todos, mas que acaba por não ser atrativo para ninguém. Uma pena.

FAIXAS DO MÊS:

- Pat Benatar - Invincible: uma música que tive contato através da playlist organizada pelo escritor Ernest Cline com o intuito de servir como trilha sonora para seu mais famoso livro, Jogador Nº 1. Mas é tão contagiante que não poderia ter ficado de fora aqui.

- Duran Duran - Union of the Snake: o mesmo acima pode ser dito aqui. E olha que eu até sou um conhecedor razoável do grupo, mas não havia tido contato com esta composição até então.

- Porcupine Tree - Time Flies: uma das melhores músicas que já ouvi na vida. Infelizmente, sua versão completa está indisponível no Spotify no momento, e um single edit ocupa seu lugar na playlist por ora.

- Megadeth - Good Mourning/Black Friday: por motivos óbvios.

- The B-52's - Roam: mais músicas contagiantes! Às vezes é algo bem necessário.

- Metric - The Art of Doubt: a segunda melhor faixa do último trabalho do grupo, que também é seu título. Serve como um lembrete sobre algo que se faz essencial para a vida.

Confira abaixo a playlist feita durante novembro de 2018:

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

"Blade Runner" ganhará um anime e sonhos podem SIM se tornar realidade


Blade Runner é um dos maiores clássicos do cinema e do imaginário cyberpunk existentes. Creio que todos saibam disso. Seu sucessor, Blade Runner 2049, lançado no ano passado, possivelmente trilha o mesmo caminho do original, que só recebeu a devida atenção anos após sua exibição nos cinemas. São muitos os pontos sobre a sequência que podem ser destacados (como fica bem claro neste texto que traduzi), entre eles a campanha de marketing, que divulgou três curta-metragens antes de sua estreia como uma forma de estabelecer uma conexão mais forte entre os dois longas, sendo eles 2036: Nexus Dawn e 2048: Nowhere to Run, ambos live-action, e Blackout 2022, um anime dirigido por Sinichiro Watanabe, criador dos renomados Cowboy Bebop e Samurai Champloo, e que deixou um gostinho de quero mais, com fãs se perguntando como seria uma série completa no estilo.

Se você foi um dos que implorou por mais material da franquia produzido em desenhos animados japoneses, então só tem a agradecer pela confirmação feita hoje de que sim, haverá um anime situado no universo de Blade Runner. Batizado como Black Lotus, será situado no ano de 2032 e contará com alguns personagens conhecidos do público em seus 13 episódios, que durarão por volta de 30 minutos. Watanabe fará parte do projeto como produtor criativo, enquanto a direção ficará sob encargo de Shinji Aramaki e Kenji Kamiyama, respectivamente conhecidos por seus trabalhos em Neon Genesis Evangelion e Ghost in the Shell: Stand Alone Complex. A exibição se dará através do bloco Toonami da Cartoon Network nos EUA e do Crunchyroll para o resto do mundo.

A notícia é provavelmente uma das melhores coisas que poderiam acontecer para a marca, seja como um todo ou para este atual momento de revitalização do nome, com a ótima recepção do último filme pela crítica (apesar da baixa arrecadação em bilheteria, especialmente se comparada com os valores de produção). A possibilidade de expansão do já rico mundo de Blade Runner é provavelmente o sonho de muitas das mentes criativas espalhadas pelo mundo, enquanto a sede por novas histórias ali situadas é o suficiente para levar os mais aficionados ao delírio. E ver pessoas tão competentes envolvidas na produção dá ainda mais motivos para colocar um belo sorriso no rosto de qualquer um.

Aliás, é importante ressaltar o quão interessantes são estas escolhas das principais mentes criativas do anime. Todos estiveram envolvidos, de uma forma ou de outra, em produções relacionadas a ficções científicas e ao universo cyberpunk: enquanto Ghost in the Shell teve fortes influências de Blade Runner ao mesmo tempo que ajudou a moldar o subgênero (para depois vir a influenciar a trilogia Matrix, que por sua vez influenciou tudo o que veio a seguir), Evangelion também bebeu muito desta fonte para definir sua identidade visual. Cowboy Bebop, por sua vez, é basicamente uma obra que poderia muito bem se passar no mesmo universo dos longas por inúmeros motivos, tanto é que a escolha de Watanabe para a direção de Blackout 2022 não foi a toa e se mostrou muito acertada, assim como a dos outros dois também parece ser.

Ainda não há data para o lançamento de Black Lotus, mas seu anúncio, por si só, já é motivo para comemoração e a prova de que sim, sonhos podem se tornar realidade. Fica a torcida para que o produto-final faça jus à expectativa, mas vendo os nomes envolvidos, fica difícil isso não acontecer.

Caso você ainda não tenha visto Blackout 2022, confira-o logo abaixo e observe o potencial que Black Lotus possui:


E se você nunca assistiu Blade Runner na vida, pelo amor de Deus, PARE TUDO O QUE VOCÊ ESTIVER FAZENDO E VÁ VER O FILME, A SEQUÊNCIA E OS CURTAS. Agradeça-me depois.

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

[RESENHA] "Bohemian Rhapsody" (2018)



Há anos que já vinha se falando sobre um filme sobre a história do Queen com enfoque em Freddie Mercury. Inicialmente, o projeto foi anunciado com Sacha Baron Cohen (Borat, Bruno, O Ditador) como intérprete do vocalista, algo que nunca foi para frente e acabou por deixar o papel sob o encargo de Rami Malek, conhecido especialmente por protagonizar a série Mr. Robot. Mas mesmo após escalados os atores que viveriam Brian May, Roger Taylor, John Deacon e Mary Austen (Gwilyn Lee, Ben Hardy, Joe Mazzello e Lucy Boynton, respectivamente) e com a maior parte do longa já gravado, o diretor Bryan Singer misteriosamente "se afastou" da produção sem muitas explicações. Foi uma estrada tortuosa, mas Bohemian Rhapsody teve as adversidades deixadas para trás e chegou aos cinemas no último dia 1º de novembro no Brasil (2 do mesmo mês para o resto do mundo) com um resultado agradável, apesar de algumas incongruências.

O roteiro trabalha a relação de Mercury com sua família, com os outros membros do grupo e com Mary Austin, além da descoberta de sua homossexualidade. E tudo isso funciona para propósitos narrativos, estruturando o filme de forma sólida e servindo a seu objetivo de cativar o público com a trajetória de uma das maiores vozes que já passaram por este mundo. Entretanto, diversas liberdades foram tomadas, mudando a ordem e a data de muitos fatos para o funcionamento da trama como planejado pela produção. Na maioria dos casos, são pormenores inocentes (como a passagem da banda pelo Brasil, que é retratada como sendo em algum momento entre 1977 e 1979, mas só veio a ocorrer de fato em 1981 pela primeira vez, enquanto o histórico show no Rock In Rio só aconteceu em 1985), quando não exagerados (a cena de Freddie tocando a melodia de Bohemian Rhapsody enquanto deitado com Mary beira o ridículo), mas distorções como a descoberta da AIDS por volta de 1985 (que na verdade se deu em 1987) desviam muito da realidade e podem confundir os menos familiarizados com a história. Além disso, momentos mais espetaculosos da vida do vocalista, como o abuso de drogas e as insanas festas dadas por ele ficam apenas implícitos no contexto das cenas que as retratam, uma decisão mercadológica para manter a classificação etária a mais baixa possível.

Ainda assim, muitos dos elementos ali mostrados possuem respaldo da realidade e são capazes de fascinar desde os mais leigos aos grandes conhecedores do Queen, especialmente no que diz respeito ao processo de composição. Ver as experimentações feitas pelo quarteto em estúdio para dar a origem a alguns de seus maiores sucessos apenas evidenciam a sua genialidade, enquanto os conflitos internos entre os membros deixam clara a realidade de qualquer banda e exploram uma faceta pouco conhecida pelo grande público. Fica a ressalva, porém, de que estes aspectos poderiam ser ainda mais ricos caso fossem mostradas algumas celebridades amigas do grupo, em especial o músico David Bowie, tão essencial para a composição de Under Pressure e participante de diversos outros importantes momentos, mas que no longa foi reduzido a apenas algumas breves menções.

Apesar destes pontos controversos quanto ao script, Bohemian Rhapsody deve muito de sua repercussão ao trabalho desenvolvido pelos atores. Mesmo no menor dos papeis, não é possível dizer que alguém esteja mal no filme, ainda mais com nomes como Aidan Gillen e Mike Myers fazendo pontuais aparições e preenchendo esta lacuna. Mas os intérpretes dos personagens principais são os grandes destaques, com caracterização, postura, modos e tiques fiéis aos dos membros da banda, seja em suas entrevistas e conversas, seja em suas apresentações nos palcos. Quem mais impressiona, no entanto, é Rami Malek, com uma performance meticulosamente estudada, dando vida a um Freddie Mercury que não deixa a dever em quase nada ao original, ficando clara a dedicação do ator em reproduzir até o menor dos trejeitos do lendário frontman, algo que se mostra explícito no vídeo que compara a apresentação do Queen no Live Aid com a reprodução no longa.

E como é de se imaginar, não há do que se reclamar da trilha sonora. As composições orquestrais de John Ottman funcionam de forma competente dentro do longa sempre que há espaço para elas. As músicas do Queen, por sua vez, embalam a grande maioria dos momentos mais memoráveis, sendo muitas vezes acompanhadas de rápidos jogos de cena retratando apresentações ou gravações em estúdio, com a melhor sendo o da própria canção-título. Foram selecionadas 20 faixas do grupo para o filme, envolvendo boa parte de seus maiores sucessos, seja de forma integral ou editada, de modo que é possível considerar o disco uma bela coletânea, especialmente por incorporar algumas versões até então inéditas no formato de áudio.

Uma adaptação ipsis literis da história do Queen para os cinemas resultaria em algo nos moldes de O Lobo de Wall Street ou Bingo, O Rei das Manhãs. Este não é o caso de Bohemian Rhapsody, não apenas por não se aprofundar nos aspectos mais pesados das vidas de seus protagonistas, mas também por tomar muitas liberdades poéticas com trajetória do grupo, ao ponto de distorcer a realidade em alguns momentos. Apesar disso, consegue acertar no retrato de muitos outros, com o auxílio do trabalho de seu elenco (em especial do impecável Rami Malek), da inteligente montagem e de uma matadora seleção musical para compor sua trilha. Não é perfeito, mas executa com competência seu trabalho de comover os adeptos de longa data e conquistar uma nova legião de fãs.

TRAILER:


CONFIRA TAMBÉM A TRILHA SONORA:

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

BALANÇO MUSICAL - Outubro de 2018


Olá! Seja bem-vindo ao meu projeto Balanço Musical, uma coluna mensal na qual falo sobre música, o que escutei no mês que se passou, o porquê das escolhas, o que me influenciou nesses dias, e publico uma playlist com uma faixa referente a cada dia do período. O objetivo não é nada além de escrever um pouco mais sobre música no blog, apresentar algumas coisas diferentes e dar às pessoas a oportunidade de conhecer novos artistas e canções. As postagens são publicadas sempre no primeiro dia útil de cada mês, o que pode ou não coincidir com o dia 1º, hoje excepcionalmente fugindo à regra devido a falta de energia elétrica que me impediu de finalizar o texto a tempo.

Todo ser humano já passou por épocas na vida em que as coisas davam sinais de que finalmente começariam a dar certo, quando na verdade tudo não passava de um alarme falso, uma pegadinha para te fazer acreditar que há algo neste mundo que vá além de decepções, tristeza e rejeições. Como sabiamente disse o Craque Daniel (interpretado pelo tão sábio quanto Daniel Furlan), em um dos vídeos do Falha de Cobertura, "A esperança é o sentimento mais nocivo que tem para qualquer ser humano", e não só por lhe manter sofrendo, como ele completa, mas também porque, quando você a cultiva, todo o resto já foi por água abaixo. 

Essa pseudo-filosofia melancólica e barata é minha forma de enxergar os eventos que se deram durante outubro, um mês que pareceu regido pela Lei de Murphy em sua interpretação mais popular, "se algo puder dar errado, dará errado e da pior maneira possível". Pequenas luzes pareciam estar ao fim do túnel, que se revelaram vaga-lumes e deixaram clara a mensagem do universo: o túnel ainda está longe de acabar. Dos grandes aos menores eventos, do esperado às surpresas, tudo parece ter existido apenas para me fazer agarrar a ínfima possibilidade de dar certo e quebrar a cara com estilo logo em seguida. E sinceramente, chega, né? A mensagem já foi entendida. É muito sofrimento para um ano só.

Pelo menos eu não fico desamparado quando o assunto é música. Como eu disse mês passado, pretendia diminuir um pouco meu consumo de música, e eu o fiz... Mas nem tanto assim. Foram 2.345 scrobbles em outubro segundo meu last.fm, contra 2.462 de setembro, o que indica sim uma queda (especialmente considerando que foram 31 x 30 dias), mas nada muito expressivo. De qualquer forma, o número também inclui 516 artistas, 714 álbuns e 1.782 faixas diferentes. E o ponto mais alto foi que consegui entrar em contato com diversos materiais lançados ainda este ano, já pensando na lista de melhores a ser lançada em dezembro.

Como não poderia deixar de ser, todas estas novidades tem espaço entre os DESTAQUES DO MÊS, ao lado de alguns petardos do passado que podem ser conferidos a seguir.

ARTISTAS DO MÊS:

- Genesis: um dos mais importantes grupos de rock progressivo em todos os tempos ganhou espaço por sua mais que conhecida qualidade, que foi o suficiente para me manter ouvindo alguns de seus trabalhos por mais de uma semana.

- U2: quem me conhece, sabe que não sou o maior entusiasta dos irlandeses, mas que amo seus trabalhos iniciais até o clássico The Joshua Tree. Acabei por redescobrir estes discos e estou até considerando a dar uma segunda chance ao que veio depois, tamanha a qualidade ali contida.

- Pink Floyd: não tinha como ficar de fora aqui, especialmente após a passagem de Roger Waters pelo Brasil no último mês, cercada pelas mais idiotas das polêmicas criadas por gente que nunca compreendeu seu trabalho.

- Rage Against The Machine: mais do que essencial após o período eleitoral.

ÁLBUNS DO MÊS:

- Legend of the Seagullmen - Legend of the Seagullmen (2018): o projeto, que envolve grandes nomes da cena atual, inclusive membros do Mastodon e do Tool, resultou em um trabalho eficiente e interessante, que combina uma boa dose de Metal ao Psicodélico e entrega músicas que podem soar estranhas em uma primeira audição, mas que crescem no ouvinte posteriormente.

- Metric - Art of Doubt (2018): o grande destaque do mês, o álbum lançado pelos canadenses no final de setembro é uma força da natureza quando se trata de hits, de modo que grande parte de suas faixas funcionaria tranquilamente como single. Viciante do início ao fim, consegue agradar desde casuais até fãs mais ferrenhos, transcendendo a esfera do Indie e conquistando até mesmo os mais aversos ao estilo. Uma grata surpresa, decerto.

- Alex Skolnick Trio - Conundrum (2018): o projeto paralelo do guitarrista do Testament é um dos melhores lançamentos instrumentais do ano, seguindo com louvor sua proposta de seguir voltado ao Jazz e apresentando algumas das mais belas músicas de 2018.

- Dee Snider - For the Love of Metal (2018): para quem associa a imagem do vocalista ao Twisted Sister e toda aquela farofada oitentista que o grupo representa, o espanto é imediato ao se deparar com este disco, totalmente voltado para o Metal e que passa longe de qualquer saudosismo, além de ser direto e inspirado. Uma verdadeira pedrada de onde menos se esperava que ela viesse.

- Disturbed - Evolution (2018): o segundo trabalho do grupo após seu retorno do hiato, em 2015, mostra-os se afastando de alguns elementos que foram importantes para seu sucesso no passado, mas que não tem mais lugar no novo caminho que pretendem seguir. Ainda assim, o Metal característico ainda se encontra presente, mas mais maduro e interpolado por algumas faixas acústicas e mais melancólicas. É um CD que faz jus a seu nome.

- Alien Weaponry -  (2018): provavelmente a novidade mais refrescante no cenário do Metal em muitos anos, estes jovens neozelandeses combinaram a sonoridade do estilo com elementos da cultura Maori e fizeram um som autêntico e pesado. Uma boa estreia e, espera-se, o início de uma jornada promissora.

- Dorothy - 28 Days In The Valley (2018): um nome em ascensão nos últimos anos, a banda encabeçada pela vocalista homônima é mais uma surpresa dentre os lançamentos deste ano, oferecendo um som criativo e de qualidade voltado ao Rock clássico, aliado a linhas vocais muito acima da média que agradam mesmo quem não é muito chegado ao gênero.

- Lenny Kravitz - Raise Vibration (2018): um dos mais renomados artistas das últimas décadas chega a seu 11º trabalho com seu já característico Funk Rock ganhando algumas novas camadas e se aproximando mais do Funk hora ou outra. Uma audição agradável que pretendo fazer mais vezes.

- Greta Van Fleet - Anthem Of The Peaceful Army (2018): o disco mais badalado do ano, tanto pela repercussão do EP lançado no último ano quanto pela inegável semelhança da sonoridade com a do Led Zeppelin, a estreia completa do quarteto traz o som voltado ao Rock clássico e as boas performances que se esperava deles. Confesso que achei que faltou um pouco mais de brilho próprio (algo que me pareceu mais presente em From The Fires), mas ainda assim o álbum agrada e traz algumas ótimas canções, especialmente em sua segunda metade. Eis outra banda que promete muito para os próximos anos.

- Gizelle Smith - Ruthless Day (2018): belo e cativante, o mais recente registro desta vocalista voltada ao Funk e ao Soul é de encher os olhos, os ouvidos e a alma. Excelente do início ao fim, é um daqueles CDs que melhora tudo ao seu redor, seja pela bela voz da artista, o ótimo papel desempenhado pelo grupo que a acompanha ou a produção acertada. Recomendado.

- The Stooges - Raw Power (1973): este disco marca presença aqui por eu ter feito uma longa comparação entre as mixagens feitas por David Bowie e Iggy Pop. Minha conclusão é que ambas são ruins, mas a do último é melhor por fazer mais sentido com a proposta do álbum. Quanto à qualidade das músicas, não há muito o que se falar quando se trata de um clássico incontestável.

FAIXAS DO MÊS:

- Beck - Colors: a música-título do álbum lançado no ano passado já havia me cativado à época, mas seu recém-lançado e divertido clipe (que conta com a participação da atriz Alison Brie) fez com que ela ficasse grudada em minha cabeça por dias.



- Metric - Dressed to Suppress: a melhor faixa de Art of Doubt e provavelmente uma das melhores do ano, é extremamente viciante e também tem um ótimo clipe lançado recentemente.


- Helloween - Halloween: uma tradição de todos os Dias das Bruxas.

Confira abaixo a playlist feita durante outubro de 2018:

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

"The Good Wife" e os bastidores da política


Já tem pouco mais de dois anos que The Good Wife chegou a seu controverso capítulo final, que dividiu os fãs e crítica, embora todos estejam em um consenso: a série durou mais do que deveria. Falhas a parte, é inegável sua importância para a televisão: tramas complexas, intrigas por todos os lados, dramas de relações familiares que caíram no caos, paixões "proibidas", o uso de casos reais e reais, dentre outros elementos, deram substância a ela e a afastaram do lugar comum dos procedurais jurídicos. Mas um destes fatores se sobressai aos demais e é, de longe, seu verdadeiro grande atrativo: o retrato do funcionamento, dos bastidores e dos jogos que envolvem a política.

A premissa do seriado foi baseada nos fatos do relacionamento entre Bill e Hillary Clinton: o marido que cai em desgraça durante mandato de cargo público após exposição em um escândalo sexual, e a esposa que engole toda essa humilhação e permanece ao seu lado, ainda que apenas para manter as aparências e por seus interesses pessoais. Claro que muitas liberdades criativas foram tomadas, mas é impossível não traçar um paralelo com a relação absurda e quase doentia vivida por Alicia (Julianna Margulies) e Peter Florrick (Chris Noth). Eles precisam manter esta farsa viva, afinal, ou cairão em desgraça com eleitorado estadunidense (tão hipócrita quanto o brasileiro, se não mais) e não terão a força necessária para alcançar seus objetivos de poder.

Também é interessante ver como funcionam as relações com terceiros e as escolhas que levam a decisões que repercutem em toda a população. Cada ato tem uma motivação por trás, e nem sempre (para não dizer quase nunca) elas são tomadas pensando no bem maior. Não é incomum a série mostrar interferências dos detentores do poder como uma forma de prestar favores, mesmo que o outro lado sequer tenha pedido, e como também há a parte jurídica da trama, isso acaba por favorecer pessoas próximas com frequência. Nem mesmo as escolhas para uma equipe de gabinete passam incólumes, sempre favorecendo amigos ou filhos destes com cargos que dificilmente refletem sua capacidade para o trabalho.

De qualquer forma, os Florrick são apenas a ponta do iceberg quando se trata do que envolve a política estadunidense. Há muitos outros personagens, entre adversários, aliados e aqueles que trabalham em benefício próprio, que dão tempero a trama e tumultuam ainda mais a vida dos protagonistas. Entre eles, é impossível não destacar Eli Gold, interpretado por Alan Cumming, também baseado em uma figura real: no caso, Rahm Emanuel, que chefiou a campanha do Partido Democrata para o Congresso em 2006 e posteriormente foi nomeado Chefe de Gabinete durante o primeiro mandato do presidente Barack Obama, permanecendo no cargo entre 2009 e 2010. Atualmente, é o prefeito da cidade de Chicago, no estado de Ilinóis.

Embora muitas vezes faça o papel de alívio cômico (graças às ótimas reações e expressões do ator escocês), Eli vai muito além desta camada e não a toa é tido como um dos melhores e mais interessantes personagens do programa. Ele é o articulador político, uma figura que beira o maquiavelismo e que faz de tudo para conseguir êxito em sua missão de fazer um candidato alcançar o cargo almejado. Seu comando dentro de uma campanha política é transparente, mas seus métodos sempre são pouco éticos, desenterrando a sujeira de adversários e prevenindo seu aliado dos riscos de algo semelhante ser feito do outro lado. No fim das contas, Gold sabe como giram as engrenagens, como funciona a cabeça do eleitorado, como "aparentar" funciona melhor do que "ser". Ele é o camisa 10 dentro do jogo, aquele quem conhece as vantagens e desvantagens e usa ambas a seu favor.

Assistir a The Good Wife é uma tarefa gratificante. Ainda que não consiga conduzir de forma satisfatória algumas de suas tramas e caia em certas armadilhas do storytelling, propostas como essa de mostrar o outro lado da política fazem o tempo investido valer a pena. A série abre os olhos do espectador, que passa a entender muitos dos movimentos feitos por candidatos, especialmente em épocas de campanha. E como bem sabe Eli Gold, em momentos como este, nem tudo que parece de fato é.

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

"Transmetropolitan", um grito de sanidade em tempos insanos (ou como a vida imita a arte com requintes de crueldade)


Transmetropolitan é uma série em quadrinhos criada por Warren Ellis e Darick Robertson, respectivamente escrita e desenhada pela dupla, com o último sendo auxiliado por Rodney Ramos. Lançada em 1997 e encerrada em 2002, totalizando 60 edições, é ambientada nos Estados Unidos em um futuro cyberpunk e apresenta o jornalista Spider Jerusalem retornando às suas atividades após se exilar de toda a sociedade por cinco anos. As regras como conhecemos hoje já não existem mais naqueles tempos, nos quais todas as doenças possuem curas, o uso de drogas é liberado, novas religiões surgem a cada minuto, os alimentos se tornaram ainda mais bizarros e por aí vai, sendo apenas a ponta do iceberg. Mas há também o que persiste: a miséria, a violência urbana, a prostituição e exploração sexual - inclusive infantil -, a falta de ética e escrúpulos dos políticos, péssima programação de TV. Através disso tudo e aliado a boas doses de humor, Ellis e Robertson estabeleceram sua sátira do que o mundo poderia vir a se tornar e teceram suas críticas às atualidades da época.

É assustador, porém, ver o quão atual a história se mostra para hoje. Claro, há alguns elementos que não acompanharam a evolução da realidade, mas outros temas se mantêm pertinentes ao que é visto por aí atualmente e devem continuar a ser pauta no futuro por sabe-se lá quanto tempo, o que pode vir a tornar a obra atemporal (e, por ora, é mesmo). Pior ainda é perceber a quantidade de previsões que foram feitas naquelas páginas, especialmente na tecnologia, mas também na sociedade e na política, nos quais vivenciamos os principais paralelos possíveis de serem feitos no momento.

O segundo ano da HQ (o que corresponde às edições 13 a 24) é todo dedicado às eleições presidenciais daquele futuro e a cobertura de Spider dos eventos, algo que ele já havia feito anteriormente e que foi o motivo pelo qual ele ganhou reconhecimento profissional e fama. O sistema bipartidarista dos EUA foi mantido até aquele momento e são candidatos o atual presidente, carinhosamente apelidado por Jerusalem de "A Besta", e seu opositor, o então senador Gary Callahan, que ganha o apelido de "Sorridente" porque, bem... Ele sorri. Até demais. E forçadamente.

Spider tem algo a dizer sobre o voto para vocês. De nada.

O protagonista, desde os primórdios de sua carreira, foi uma força contrária ao Chefe de Estado no poder e sempre fez de tudo para infernizar sua vida, mas durante uma conversa franca entre os dois, algo ficou claro: A Besta, apesar de ser um lixo de ser humano, tinha princípios e fazia o mínimo para manter o país funcionando. Não que seja algo impressionante, mas já ia além do que ele imaginava. Investigar o adversário, no entanto, foi mais complicado: era uma figura de pouca relevância política até então, sendo desconhecido pela população geral, inclusive pelo jornalista que, afinal, passou 5 anos longe de todo e qualquer contato com a civilização. Mas ele o faz mesmo assim, expõe alguns escândalos de Callahan e traz o seu verdadeiro eu a tona: o Sorridente odeia a população, pretende fazê-la sofrer e, se eleito, ira acabar com a vida de Spider. Simples assim. E em meio a isso tudo, acontece um atentado que alavanca sua popularidade.

Chega o dia da votação e, apesar de todos os esforços feitos para mostrar que A Besta ainda tinha alguns (poucos) escrúpulos e o Sorridente era puramente diabólico, a população elegeu Gary Cahallan com uma ampla vantagem. E isso revoltou Spider Jerusalem ao máximo pois, por mais que ele tenha cumprido seu dever e dado todos os avisos, o país preferiu ignorar tudo isso e ir direto na pior opção, como voluntários para ver se o abismo tinha fim. O que seguiu a eleição foi uma série de eventos horríveis, indo desde a censura da mídia e da liberdade de expressão até a ordenação de massacres deliberados contra inocentes. Não foi por falta de alerta.

A lição que fica de Transmetropolitan, dentre várias outras, é: ouçam os Spider Jerusalem que estão por aí (e, se possível, SEJA você também um Spider Jerusalem). Confie na realidade diante de seus olhos, não sob a ótica de outros. Ouça o que gente renomada tem a dizer. Procure fontes. E, acima de tudo, não pague para ver se pode piorar, porque pode sim, e muito. Spider parecia a única voz sã berrando para um bando de insanos, foi ignorado e tudo de pior que poderia acontecer, aconteceu. A realidade que vivemos tem mais vozes, mas parece estar seguindo pelo mesmo caminho. Não deixe que o mostrado no quadrinho saia de suas páginas.

A revolta de Spider. E com razão.

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Faltou "The Handmaid's Tale" ao Brasil


O Conto da Aia é um livro escrito por Margaret Atwood, lançado em 1985, que retrata um futuro distópico no qual mulheres perderam seus direitos civis dentro de uma sociedade em que vigora o totalitarismo teocrático militar. A obra foi aclamada pela crítica durante seu lançamento, tendo recebido ou sido indicada a vários dos principais prêmios da literatura de língua inglesa, e ganhou adaptações para outras mídias, motivo pelo qual voltou aos holofotes recentemente: a estreia da série The Handmaid's Tale em 2017 nos Estados Unidos, através da plataforma de streaming Hulu, fez com que muita gente estabelecesse contato com as ideias da autora pela primeira vez.

Estrelada por Elisabeth Moss e com um elenco de apoio de peso, contando com nomes como Alexis Bledel, Yvonne Strahovski, Joseph Fiennes, Samira Wiley e Ann Dowd, a produção teve início em 2016 e foi ao ar em 2017 nos EUA, durante o início da cada vez mais caótica e controversa administração do Presidente Donald Trump que, em sua vida pessoal e mesmo durante sua campanha eleitoral, apresentou posturas e declarações de cunho machista e desrespeitoso acerca das mulheres e seu papel na sociedade. O público feminino do país consumiu e absorveu o seriado como uma mensagem de luta e resistência, diariamente fazendo seu máximo para que a ficção nunca venha a se tornar realidade.

Motivos para isso não faltam. The Handmaid's Tale é forte, pesada, dura de se assistir. O mundo aqui retratado é a verdadeira definição de pesadelo e não apenas para quem é mulher, mas para qualquer um que preze pela sua liberdade. Mulheres que foram reduzidas a invólucros de procriação, servas, doutrinadoras ou donas de casa. Condenação de homossexuais à morte por transgressão. Exposição dos corpos de progressistas em locais públicos. Forte hipocrisia daqueles que estão no poder diante das próprias regras que estabeleceram. Tudo isso se encaixa dentro de uma trama tão agoniante quanto bem desenvolvida, potencializada por uma fotografia opressora e claustrofóbica junto a uma produção impecável, e capitaneada por uma atuação estelar de Elisabeth Moss. A soma de todos estes elementos faz desta uma das melhores e mais importantes séries da atualidade, que não a toa chegou a faturar inúmeros prêmios em eventos importantes como o Emmy e o Globo de Ouro.

Infelizmente, ela não repercutiu tanto assim no Brasil. Não houve muita exposição, há pouco engajamento de espectadores em redes sociais. A mídia, salvo alguns poucos veículos especializados, não deu a devida atenção a uma obra de tamanha relevância e destaque no cenário internacional. E a questão que fica é: por quê? Será que não pareceu algo chamativo ao público? Será que não identificaram nela potencial comercial aos brasileiros? Será que foi ignorada de forma deliberada? Ou será que há algum outro motivo por trás? Não dá para saber, mas seja lá o que ocorreu, acabou por deixar o seriado nas sombras, e não é incomum trazê-lo a conversas entre amigos e descobrir que ninguém ali sequer ouviu falar dele.

O principal responsável por este fenômeno está, porém, na falta de acesso do público. A série vinha sendo exibida pelo canal Paramount da TV a cabo - restrito apenas aos pacotes mais caros das operadoras - e só recentemente chegou ao GloboPlay, serviço de streaming da maior emissora do país que ainda é uma novidade no mercado. E em uma época que as pessoas desaprenderam a usar torrents e estão presas em bolhas de conforto e facilidade da Netflix e afins, consumindo qualquer lixo que apareça nos destaques, isso faz uma diferença gritante. A título de comparação e curiosidade, a página brasileira de La Casa de Papel, um dos maiores fenômenos da citada Netflix por aqui, possui 2,6 milhões de curtidas no Facebook (um milhão a mais que a oficial em espanhol). Sabem quantas curtidas possui a página organizada por fãs brasileiros de The Handmaid's Tale? 33 mil.

Um contato maior com o programa (e, consequentemente, sua mensagens e ideais) por parte do público do país, especialmente o feminino, poderia mudar o cenário que observamos na atualidade, com um número elevado de mulheres aderindo e se mostrando partidárias de uma ideologia que vai contra elas, seus direitos e, em alguns casos, sua própria existência na sociedade, no que eu venho chamando de "o paradoxo Serena Waterford" - assista a série e entenda. Claro que há muitas outras questões complexas a serem analisadas quanto a isso, mas levar tamanho choque de realidade ao assistir àqueles episódios duríssimos de um produto bem feito e viciante talvez já fosse um grande avanço para que se abrisse os olhos acerca destas questões. Este é o papel da arte, afinal: mais do que entreter, ela deve desafiar, tirar o espectador (como é o caso) de sua zona de conforto e fazê-lo refletir.

Nunca é tarde para se começar a assistir a série. Mas diante do que está projetado, é possível falar com segurança: faltou The Handmaid's Tale ao Brasil. No entanto, ao invés de encerrar de forma desesperançosa ao dizer que, infelizmente, talvez seja melhor já ir se acostumando a expressões como "sob Seu olho", "abençoado seja o Fruto" e "que o Senhor o abra", é preferível deixar uma mensagem mais condizente com o que a protagonista interpretada por Elisabeth Moss demonstra com suas atitudes. Afinal, a luta não acabou, pelo contrário. E, portanto, Nolite Te Bastardes Carborundorum.

terça-feira, 23 de outubro de 2018

"Rosa", o episódio que deu o tom a uma nova era de "Doctor Who"


No ano passado, fiz questão de escrever resenhas para cada novo episódio de Doctor Who. Era, afinal, a última temporada tanto do ator Peter Capaldi como o protagonista, quanto de Steven Moffat como showrunner, colocando um ponto final em sua longa estadia na produção do programa. Foi também a única oportunidade de vermos a companion Bill Potts (interpretada por Pearl Mackie), uma personagem que trouxe questões como racismo, orientação e liberdade sexual com mais ênfase à série, que sempre deu espaço para a diversidade, especialmente em sua atual encarnação. Foi uma experiência boa e interessante, mas preferi não repetir o feito desta vez e pretendo falar deste novo ano após sua conclusão, para analisá-lo como um todo ao invés de fazê-lo em partes.

Mas o mais recente episódio exibido, Rosa, obriga-me a fazer uma exceção a esta regra autoimposta.

Até o momento, a 11ª temporada vinha muito bem: The Woman Who Fell on Earth e The Ghost Monument foram os cartões de visita deste novo momento do show, comandado por Chris Chibnall e com uma mulher a frente do papel principal, além de um time de três companheiros de aventuras composto por um idoso, uma descendente de paquistaneses e um negro com dificuldades motoras. De novidades em comparação ao que foi visto anteriormente, o ritmo e a linearidade das tramas, aliados a uma reformulada identidade visual, o inegável carisma de Jodie Whittaker como a Doutora e o funcionamento efetivo e inteligente do trio de personagens humanos são um respiro de ar fresco, ao mesmo tempo que a manutenção da sensação de aventura contínua e elementos de ficção científica pura dão o senso de familiaridade necessário para que qualquer um que assista tenha apenas uma certeza: isto (ainda) é Doctor Who.

E todos estes elementos, claro, seguem presentes em Rosa, mas o episódio seguiu um caminho diferente dos demais por se distanciar do tom descompromissado do seriado e optar por uma abordagem séria de eventos históricos importantes. Tal tonalidade não é nenhuma novidade para o programa, mas raramente foi utilizada para retratar momentos do passado da humanidade, com a principal fuga deste padrão sendo Vincent and The Doctor, focado em Van Gogh e as dificuldades psicológicas que enfrentou ao longo da vida em uma tocante passagem da 5ª temporada. Mas o clima aqui é pesado, grave e transmite uma sensação de urgência como pouco vista antes.

O título do capítulo deixa claro qual seu enfoque: a figura de Rosa Parks, mulher negra que se recusou a abrir mão de seu assento para dar espaço a brancos, foi presa e tornou-se essencial para o início das lutas da população afro-estadunidense por seus direitos civis. A Doutora e seus companions são levados à cidade de Montgomery, no Estado do Alabama, em 1955 pela TARDIS e devem deter uma desconhecida ameaça que quer impedir a ocorrência de tais eventos, algo que, por si só, mudaria toda a história e a realidade em que vivemos de formas inimagináveis.

Durante seus pouco mais de 40 minutos de duração, somos colocados cara a cara com a dura realidade do Sul dos Estados Unidos durante aquela época: racismo e segregacionismo latentes, em que ônibus tinham lugares separados para "brancos" e "pessoas de cor", estabelecimentos que se reservavam a não servir clientes baseados na pigmentação de suas peles e outras atrocidades que soam absurdas e criminosas na atualidade. E quem mais sente todo esse preconceito são Yas e Ryan, os companions que representam minorias étnicas e que, assim como eu e provavelmente você, leitor, viveram a vida toda em uma realidade em que este tipo de ódio ainda existe, mas a situação está "melhor" (como dito por eles), e ver ou vivenciar isto de forma tão latente é um choque para qualquer um.

Diálogos, interações e reações envolvendo o tema aqui funcionam como verdadeiros socos no estômago do espectador, como deveria ser ao se tratar de algo tão grave. Seriedade não é algo novo para Chris Chibnall, idealizador e condutor da série de investigação policial Broadchurch (que também conta com Jodie Whittaker ao lado de outras populares figuras entre os whovians, como David Tennant e Arthur Darvill), mas aplicar tal tonalidade a Doctor Who, especialmente ao se considerar o retrospecto, deixa clara a mensagem de que uma nova era se iniciou para a série, em que questões importantes e necessárias serão retratadas de forma adequada. E se formos considerar o elevado patamar estabelecido por Rosa, que já considero um dos melhores episódios de toda a série, a mudança é mais que bem-vinda. 

segunda-feira, 22 de outubro de 2018

SUPERMAN - 80 anos, 8 histórias #3: "Superman - Entre a Foice e o Martelo"


Bem-vindos ao meu especial sobre o Superman, no qual falarei sobre 8 diferentes histórias do personagem como forma de celebrar seus 80 anos. Essas histórias podem variar entre arcos, edições únicas ou fases completas. Mais do que recomendar quadrinhos, espero que possa transmitir o que cada uma das escolhas significa para mim. Hoje, Verdade, Justiça e o Modo de Vida Soviético em um dos mais marcantes contos do personagem na Era Moderna.

E se a nave do Superman chegasse à Terra com 12 horas de diferença, não caindo em uma área rural do Kansas, mas sim em uma fazenda na União Soviética?

Esta provavelmente é uma pergunta que ninguém havia feito antes. Exceto o escritor Mark Millar, que se questionou sobre isso após ler, ainda criança, uma história publicada em Superman #300, em que a nave de Kal-El caía em território neutro entre os EUA e a URSS, com ambos os lados disputando a custódia do visitante de outro planeta. O impacto da ideia em sua mente foi tão grande que ele fez questão de guardá-la pelo tempo que fosse necessário até que pudesse trabalhar com ela de forma adequada. E demorou, mas ela finalmente pode ver a luz do dia, mais de 20 anos depois de a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas deixar de ser uma ameaça e sequer existir.

Superman - Entre a Foice e o Martelo foi publicada em 3 partes no ano de 2003, durante uma época em que não era incomum ver versões alternativas de heróis da DC dando as caras através do selo Túnel do Tempo (Elsewords, no original), o que chegou a render curiosidades como Superman: Morcego de Aço ou Batman: In Darkest Knight (que, pasmem, segue inédito no Brasil), além de clássicos absolutos como JSA: A Era de Ouro e Reino do Amanhã. Desde então, se tornou uma das mais celebradas e queridas interpretações do personagem, seja por sua história, a forma que realizou sua releitura ou os dilemas e questionamentos que traz dentro de seu roteiro.

Não importa a orientação política: o Superman sempre será o Superman.

A trama engloba um período compreendido entre 1953 e 2001, e se desenvolve a partir da questão levantada ao início do texto: a nave de Kal-El cai em uma fazenda coletiva na Ucrânia, território pertencente aos soviéticos, e ele ali cresce até decidir revelar sua existência em público, realizando seus primeiros atos heroicos em Moscou e rapidamente sendo adotado pelo povo e, principalmente, pelas lideranças do Partido Comunista e do governo, ainda encabeçadas por Josef Stalin. Sua aparição não passa despercebida do outro lado do mundo, porém, e o governo dos Estados Unidos logo alerta sua população sobre a existência do "campeão do trabalhador comum que luta uma batalha sem fim por Stalin, socialismo e a expansão internacional do Pacto de Varsóvia", acionando na sequência seu mais brilhante cidadão, Lex Luthor, casado com a intrépida jornalista do Planeta Diário que fez sua carreira como Lois Lane.

Este tipo de brincadeira com o que é conhecido sobre o Superman do universo principal da DC vem a ser um dos principais atrativos do quadrinho. Ver o Homem de Aço pautar seus ideais conforme aquilo que acredita ser certo dentro do regime ditatorial socialista acaba por dar uma nova dinâmica ao personagem, ainda que seu conceito principal permaneça inalterado (dentro de uma lógica distorcida, é claro). Luthor, por sua vez, acaba sendo a grande estrela em seu país ao não ser ofuscado pelo herói, até conquistando aquela que normalmente seria sua esposa, mas sua obsessão pelo alienígena soviete e suas tentativas de derrotá-lo acabam por manter o gênio na posição de antagonista, seja em sua versão cientista louco, magnata dos negócios ou presidente, em alusão às várias fases vivenciadas pelo vilão. Estas reimaginações não se limitam aos protagonistas, no entanto, e acabam abraçando muitos outros elementos conhecidos da editora, rendendo até uma versão socialista da Mulher-Maravilha, um Batman em total oposição ao sistema, um Jimmy Olsen agente da CIA e por aí vai. 

A grande força de Entre a Foice e o Martelo está, porém, na forma com que Millar conduz o quadrinho. Em meio a um enredo repleto de elementos tipicamente super-heroicos e de ficção científica, está um forte comentário político, como é de se imaginar. E o escritor triunfa justamente ao fugir do senso comum, não se deixando levar por uma visão maniqueísta de "capitalismo bom, socialismo ruim" ou vice-versa, focando-se em retratar os pontos fortes e fracos de ambos os sistemas. Quando trata do regime mantido pelos soviéticos, por exemplo, em meio a distribuição de renda, lobotomias, pleno acesso e funcionamento de serviços públicos e eliminação de opositores a sangue frio, fica clara a mensagem: apenas um verdadeiro super-homem poderia fazer aquele sistema funcionar, e não a toa ele fracassou. E do lado estadunidense, a liberdade e a democracia vêm acompanhadas da demonização de seus adversários, do apoio a homens insanos como último recurso, da quebra do sistema capitalista em face de um duro bloqueio econômico e seu retorno à prosperidade apenas através de uma rígida interferência estatal em diversos setores da sociedade. Estes são apenas alguns exemplos dentre vários outros que traduzem o pensamento do autor quanto ao fato de não haver preto no branco quando o assunto é política, apenas áreas densamente cinzas que se refletem tanto no Superman quanto em Lex Luthor, ambos frutos dos sistemas em que foram criados.

Tal clima político seria bem menos impactante se não fosse o trabalho de arte desenvolvido nas três edições da HQ. Embora haja uma clara diferença entre os estilos de Dave Johnson e Kilian Plunkett, ambos tem êxito na execução da proposta de misturar propaganda e símbolos socialistas a um traço muito semelhante ao visto no desenho animado do Superman da década de 1940, produzido pelos irmãos Fleischer. É estranho ver uma mudança entre artistas no meio da minissérie, mas ela faz sentido se pensada como uma forma de representar a mudança de época em forma de um comentário metalinguístico, referenciando-se às eras dos quadrinhos de super-herói, algo que acontece no roteiro através de uma mudança na tonalidade da trama e no comportamento dos personagens. Ou simplesmente pode ter sido algo necessário para cumprir os prazos para entrega das revistas. Seja como for, os dois cumprem o papel que lhes é incumbido, com quadros detalhados e figuras dinâmicas. E, como curiosidade, é justo ressaltar que Alex Ross participou dos estágios iniciais da concepção visual, trabalhando a aparência e uniforme do protagonista nesta reinterpretação.

A Era de Prata dos quadrinhos de super-herói, vista sob a ótica soviética.

Para uma história tão ambiciosa, apenas um final a altura seria aceitável. E o que foi entregue não decepcionou, pelo contrário: o inteligente desfecho para o conflito, seguido de uma gritante reviravolta nas páginas derradeiras, são marcantes o suficiente para fazer com que qualquer fã coloque a obra entre suas favoritas, tanto do herói quanto do meio. É curioso pensar que a conclusão da briga entre Estados Unidos e União Soviética, embora seja precedida por um confronto com todos os elementos clássicos de um gibi super-heroico, se dá através de uma solução psicológica, assim como foi boa parte do enfrentamento da Guerra Fria. E quanto a inesperada virada vista ao fim, sua existência é devida a ninguém menos que Grant Morrison, que aconselhou o então amigo Mark Millar a encerrar a trama de tal forma. Pode parecer uma simples contribuição, mas é difícil imaginar o quadrinho recebendo tamanha aclamação sem este "pequeno" detalhe, que o faz beirar o impecável de cabo a rabo.

Superman: Entre a Foice e o Martelo teve grande repercussão e publicações em todo o mundo. No Brasil, saiu pela primeira vez em 2004, respeitando o formato de minissérie em três edições individuais, que foram encadernadas e trouxeram a história de volta ao mercado em 2006, em uma edição de capa cartonada. Depois disso, apenas em 2017 o publico pode ter novamente acesso a uma versão localizada do quadrinho, com o lançamento de um encadernado em capa dura e preço acessível. Todas elas ficaram por encargo da Panini que, infelizmente, cometeu alguns deslizes em seu mais recente formato e deixou passar alguns erros grotescos de tradução, ortografia e revisão, sendo o mais simbólico deles o "capas" no lugar de "capaz" logo nas primeiras páginas, o que espera-se que tenha sido corrigido em reimpressões posteriores.

Talvez ninguém tenha se perguntado antes o que teria acontecido se a nave do Superman tivesse caído na URSS ao invés dos EUA, com exceção de Mark Millar. Mas a resposta para esta questão acabou por tomar o mundo de assalto e marcar a já extensa história do super-herói mais antigo existente em uma de suas mais criativas reinterpretações. Mais do que isso, serviu para desmistificar imagens criadas durante a Guerra Fria e mostrar que não existem questões fáceis quando se trata de política, um campo que, definitivamente, não permite distinções brandas entre heróis e vilões na disputa por hegemonia e poder.