Queira ou não, goste ou não, o Venom é um dos personagens mais populares que saiu das páginas dos quadrinhos do Homem-Aranha. Surgido como vilão no final dos anos 1980 e transformado em anti-herói graças a seu crescente apelo nas histórias do aracnídeo, a criação de Todd McFarlane e David Michelinie já passou por diversas fases (chegando até a integrar os Guardiões da Galáxia) e seu simbionte já fez par com diversos hospedeiros, mas sempre é lembrado pelo original, Eddie Brock, e o clima de terror e violência que marcaram sua primeira aparição. O impacto de seu surgimento foi grande o suficiente para angariar fãs e levá-lo até as telas do cinema pela primeira vez como um dos antagonistas de Homem-Aranha 3, em 2007, e retornar neste como protagonista de Venom, sua primeira empreitada solo que, por escolha dos produtores, mostra-se isolado do universo do herói que o colocou nos holofotes.
Infelizmente, apesar de estar indo bem nas bilheterias, seu filme autointitulado acabou não vivendo às expectativas, decepcionando tanto crítica quanto público, que se depararam com uma história desorganizada que não foge do básico, momentos bizarros e efeitos especiais pouco convincentes, de modo que nem mesmo as boas atuações do competente elenco conseguem se sobressair às inúmeras falhas. É uma pena e um desperdício, de fato. No entanto, nem tudo são más notícias quando se trata do personagem: Venom vive uma de suas melhores fases nas páginas das revistas em quadrinhos, com roteiros de Donny Cates e desenhos de Ryan Stegman, dois talentos em ascensão que vêm ganhando cada vez mais espaço na Marvel.
Logo na primeira edição da HQ já é possível perceber o quão diferenciada ela é: tudo se inicia com Brock tendo sonhos estranhos situados na Idade Média, em que ouve um idioma que não consegue identificar. Ao acordar, encontra o simbionte acuado, sem entender o que está acontecendo ao certo. Ainda assim, resolvem sair para patrulhar e tentar salvar algumas vidas. É a partir daí que as coisas ficam ainda mais interessantes: o parasita alienígena foge do controle em um confronto, Eddie descobre que o "seu outro" (como ele carinhosamente chama o organismo extraterrestre com quem divide o corpo) não foi o primeiro a aparecer na Terra e parte em busca dos velhos companheiros de equipe de um ex-agente da SHIELD que conhece entre estes acontecimentos.
Parece loucura, não? Pois essa pegada se mantém nos números seguintes, adicionando cada vez mais elementos absurdos. Mentes conectadas, dragões intergaláticos, deuses do abismo, ligações com a origem do universo e os Celestiais, a guerra do Vietnã... É possível encontrar tudo isto e mais um pouco em Venom. E o mais impressionante é que FAZ TOTAL SENTIDO. O trabalho de Cates na criação e desenvolvimento da trama consegue encaixar os mais variados elementos das principais fases do personagem (e até de outros, como é o caso do Thor) e combiná-los com criações próprias para trazer a tona uma mitologia rica e que faz jus às raízes do antigo vilão do Homem-Aranha. Ao mesmo tempo, não se esquece de entreter o leitor e equilibra o desenrolar da história com cenas de ação frenéticas ao lado de Stegman que, apesar de apresentar uma arte ligeiramente confusa em alguns momentos, entrega grandiosidade e exagero sempre exigido dele.
O gibi vem se destacando nos Estados Unidos, com inúmeros elogios dos veículos especializados edição após edição, além de ter conquistado uma boa base de fãs, que provavelmente foi formada pelos incansáveis fanáticos pelo anti-herói, apreciadores de uma boa leitura e quem entrou no hype do filme e acabou se deparando com uma ótima publicação. Curiosamente ou não, a revista triunfa exatamente nos aspectos que o recente longa falhou, apresentando uma trama coerente e que foge (muito) do lugar comum, momentos que surpreendem e um bom trabalho artístico. Ryan Stegman declarou uma vez que "Venom era melhor que Watchmen", algo que rapidamente foi abraçado pelos leitores. Uma brincadeira, claro, mas seu trabalho ao lado de Donny Cates vem se mostrando de altíssimo nível e não é exagero dizer que a dupla está fazendo uma das melhores HQs atualmente disponíveis no mercado, a qual certamente já marcou a história do personagem.
Acredite: este é só o início das pirações que acontecem em "Venom". Ficou curioso? Vá ler a HQ!