terça-feira, 9 de julho de 2013

CRÍTICA: Iron Maiden - Somewhere In Time [1986]


Antes de começar a análise, gostaria de explicar o porquê da minha escolha. O certo seria começar a seção de música com um lançamento atual, como "13" do Black Sabbath, "Random Access Memories" do Daft Punk ou o auto-intitulado do The Winery Dogs. Ao invés disso, escolhi um álbum antigo, lançado em 1986 pelo Iron Maiden, e que na época não foi o que pode se chamar de "um verdadeiro sucesso de crítica", apesar de ter um reconhecimento muito maior nos dias de hoje. O fato é que "Somewhere In Time" significa muito para mim: é o meu preferido dos ingleses, um dos primeiros que ouvi na vida, o primeiro CD que eu comprei e também a primeira crítica musical que escrevi na vida, em outubro de 2009, lá no Bar Obi-Wan. O problema é que aquele texto está defasado, com muitas repetições e nada de dinâmica. Há muito tempo queria reescrevê-lo, antes mesmo de encerrar as atividades do meu antigo blog, mas sempre esquecia e acabei deixando de lado. Recentemente, porém, eu o li novamente e pensei: "isso aqui precisa de uma reescrita URGENTE!". Então, nada mais justo do que fazê-lo aqui no Valar Morghulis, Valar Dohaeris.

Dadas as explicações, vamos ao que interessa. Voltemos no tempo, para o biênio 1984-1985. O Iron Maiden havia lançado "Powerslave", considerado por muitos uma obra-prima do Metal e o melhor disco do grupo até então. Com músicas fortes e concisas, como "Aces High" e "2 Minutes to Midnight", e uma performance ímpar, o registro conquistou headbangers do mundo todo. Prova disso foi sua turnê de divulgação, "World Slavery Tour", que contou com uma produção colossal e um público de mais de um milhão de pessoas no total de seus 187 shows, sendo que cerca de 300 mil estiveram presente na primeira passagem dos britânicos no Brasil, durante a primeira edição do Rock In Rio. Todo esse sucesso foi registrado no ao vivo "Live After Death". Estava mais do que claro que o Maiden havia se tornado um fenômeno mundial, e uma das maiores bandas da época. Se "The Number of the Beast" fez com que eles estourassem na mídia, foi com "Powerslave" que eles se consolidaram.

Terminada a longa tour, de 331 dias de duração, eles se perguntaram: "OK, estamos no topo. E agora?". Precisavam se superar, ou ao menos manter a qualidade do anterior. Bruce Dickinson veio com algumas  músicas acústicas, dizendo que precisavam de algo como "Led Zeppelin IV" ou "Physical Graffiti", ou então estagnariam e cairiam no esquecimento. Os outros integrantes negaram todas, e ficaram com as composições feitas pelo baixista e chefe Steve Harris e o guitarrista Adrian Smith. Resolveram então se focar na continuidade dos trabalhos anteriores, refinando ainda mais seu som pesado e muitíssimo bem trabalhado e adicionando um novo elemento: guitarras sintetizadas (que, ao contrário do que muitos pensam, não são aqueles teclados segurados como uma guitarra), o que o deixou mais futurista. Gravaram músicas com a temática comum "tempo-espaço", algo que não foi combinado segundo relatos dos próprios músicos, e contaram com a produção do renomado Martin Birch, que também trabalhou com eles em diversos outros  álbuns.

Assim surgiu "Somewhere In Time", o sexto registro de estúdio do Iron Maiden, lançado no dia 29 de setembro de 1986. Ele dividiu a crítica na época, com muitos elogiando a nova abordagem e muitos criticando-a por se distanciar do que foi ouvido anteriormente. De qualquer forma, foi um sucesso comercial, tendo ganho o Disco de Platina e vendido mais de um milhão de cópias apenas nos Estados Unidos. A sua turnê de promoção, "Somewhere On Tour", também teve um impacto positivo, passando pela Europa, América do Norte e Ásia, num total de 151 apresentações entre setembro de 1986 e maio de 1987.

"Tá, tudo isso é muito legal, mas o que esse disco tem de tão especial?" Simples: TUDO. A começar pela fantástica capa, uma verdadeira obra-prima do desenhista Derek Riggs. Ela traz o mascote Eddie como se fosse um ciborgue, em um ambiente futurista e distópico inspirado no excelente filme "Blade Runner", estrelado por Harrison Ford. Belíssima e cheia de detalhes, também traz diversas referências a elementos ligados à banda e seus gostos, como a lixeira vista ao fundo do primeiro álbum, um placar com o resultado "West Ham 7 x 3 Arsenal", Ícaro caindo, a TARDIS da série "Doctor Who"... Até mesmo o Batman está presente. Isso também se repetiu com as artes dos singles, também feitas por Riggs.

A arte completa de "Somewhere in Time", em uma resolução melhor.

Se a apresentação visual já é de cair o queixo, o conteúdo consegue superar. As músicas de "Somewhere In Time" são atemporais. Você pode ter ouvido-as na época do lançamento, pode ouvi-las hoje e pode ouvir daqui a mais 30 anos: elas nunca soarão antigas. Todas contam com excelentes letras e um instrumental arrebatador, que soa futurista e clássico ao mesmo tempo, com todos os elementos que elevaram o Maiden ao status de gigantes do Metal e a adição mais do que certeira das guitarras sintetizadas, que de certa forma os renovaram e trouxeram o clima perfeito às composições. Um verdadeiro trabalho de mestre do até então quinteto inglês, com total destaque ao vocalista Bruce Dickinson, em sua melhor performance de estúdio, e ao guitarrista Adrian Smith, que, além de seus ótimos riffs e sensacionais solos repletos de feeling, se mostrou mais uma vez um excelente letrista e compositor, sendo autor de ambos os singles lançados. Vale ressaltar também a excelente produção de Martin Birch, com uma mixagem limpa e bem feita até mesmo para os dias atuais.

O álbum começa com "Caught Somewhere In Time", com uma introdução lenta, mas que logo se torna rápida, pesada e apresenta solos incríveis da dupla Dave Murray e Adrian Smith. O single "Wasted Years" é uma das minhas músicas favoritas da história, graças a sua letra, instrumental e até mesmo o clipe. "Sea of Madness" merecia mais destaque, devido ao seu equilíbrio entre o peso e a melodia, especialmente em passagem mais lenta na metade de sua duração. "Heaven Can Wait" se assemelha bastante com o que foi produzido anteriormente (especialmente em "The Number of the Beast"), e é uma das poucas de "SiT" tocadas ao vivo até hoje. "The Loneliness of the Long Distance Runner" tem um ritmo frenético, assim como uma corrida, e é possível até mesmo sentir toda a necessidade do eu lírico de vencer a competição. Uma canção sem igual em toda a discografia do grupo.

"Stranger in a Strange Land", o segundo single, dá uma desacelerada no disco. Não chega a ser uma balada, mas é mais cadenciada, com uma melodia sensacional e mais uma performance de destaque de seu autor, Adrian Smith. Ela fala sobre um explorador que morreu no Ártico e teve seu corpo encontrado apenas 100 anos depois, além de trazer um sentimento de saudades de seu local de origem. Seguindo adiante, temos "Deja-vu" que, apesar da excelente letra, apresenta o instrumental mais fraco do registro. Não me entendam mal: ela é ótima , mas muito inferior se comparada com as demais. A última música, "Alexander The Great", encerra da melhor maneira possível. Um verdadeiro épico, muito pedida ao vivo até hoje e considerada por muita gente a melhor do Iron Maiden. Conta sobre a vida do conquistador Alexandre, o Grande, e é impecável em todos os seus aspectos. Todos os integrantes merecem destaque pelo seu desempenho perfeito nela.

A qualidade de "Somewhere In Time" é tamanha que também não posso deixar de comentar os B-Sides dos singles. De "Wasted Years", temos a excelente "Reach Out", que conta com o guitarrista Adrian Smith no vocal e que também foi escrita por ele, e "Sheriff of Huddersfield", que é na verdade uma zoação com o empresário Rod Smallwood, que não conseguia se adaptar a Los Angeles e estava sempre reclamando. "Stranger in a Strange Land", por sua vez, trouxe "That Girl", belíssima música que até hoje não se sabe se é um cover da banda FM ou se Smith esteve envolvido com a composição e resolveu gravá-la, e "Juanita", divertida canção que é um cover do Marshall Fury.

Se "Somewhere In Time" não foi extremamente aclamado na época de seu lançamento e dividiu opiniões, hoje não se pode dizer o mesmo. Atualmente tem total reconhecimento dos fãs, que imploram para o atual sexteto tocar mais de suas músicas ao vivo, especialmente "Alexander The Great". Talvez seja injustiçado, por não ter o merecido destaque dentre os lançamentos do grupo. Mas pode ter certeza: não é por ser ruim. Pelo contrário, é um dos melhores álbuns de Metal da história. Sua sonoridade fantástica, o equilíbrio entre o peso e a melodia, músicas bem trabalhadas, letras inspiradoras, arte da capa... Como eu disse, tudo é especial nele. Junto com "Powerslave" e "Seventh Son of a Seventh Son", compõe o que chamo de "Santíssima Trindade", também conhecido como "The Golden Years". É o melhor que o Iron Maiden tem a oferecer, e com toda certeza é o meu preferido.

NOTA: 9,5

Bruce Dickinson - vocal
Steve Harris - baixo, baixo sintetizado, backing vocal
Adrian Smith - guitarra, guitarra sintetizada, backing vocal
Dave Murray - guitarra, guitarra sintetizada
Nicko McBrain - bateria

TRACKLIST:
1. Caught Somewhere In Time
2. Wasted Years
3. Sea of Madness
4. Heaven Can Wait
5. The Loneliness of the Long Distance Runner
6. Stranger in a Strange Land
7. Deja-vu
8. Alexander The Great

SINGLES: