sexta-feira, 12 de julho de 2013

5 filmes que mudaram a história das adaptações de heróis

Hoje, dia 12/07, é a estréia nacional do novo filme do Superman, "O Homem de Aço" (ou "Man of Steel", no título original). Devo dizer que não sou o maior fã do personagem, mas estou muito afim de ver esta nova adaptação, dirigida por Zack Snyder e produzida por Christopher Nolan e David S. Goyer. Uma visão mais realista e repleta de ação de suas origens era algo necessário há muito tempo, especialmente após o fiasco de "Superman Returns". Claro que demorou até chegar a este ponto, com muitos lançamentos de sucesso e fracassos que moldaram o gênero. Pensando nisso, escolhi 5 dos quais acredito que sejam os mais importantes filmes de herói no cinema. Eles não estão em ordem de importância, e sim em ordem cronológica (mas, se formos pensar, dá na mesma, cada um contribuiu com algo diferente em sua respectiva época). Confira abaixo:

Superman - O Filme (Superman - The Movie, 1978)

Como eu disse, não sou o maior fã do Superman. Porém, sua influência é inegável, tanto no mundo dos quadrinhos quanto no mundo do cinema. Esta é a que pode ser considerada a primeira adaptação de herói, ou, ao menos, a primeira boa adaptação. "Superman - O Filme" é considerado um marco da história dos filmes, devido a sua fidelidade às HQs, seu bom roteiro, seu efeitos revolucionários (fazer um homem voar naquela época era algo impressionante) e o elenco repleto de estrelas como Marlon Brando, Gene Hackman e Christopher Reeve. Hoje pode parecer velho e desatualizado, mas sem dúvidas foi importante em seu tempo e pode ser considerado um clássico. Se não tivesse emplacado, provavelmente as coisas seriam diferentes.

Batman (Batman, 1989)

A série de TV dos anos 1960 estrelada por Adam West foi muito importante para o Batman, pois o popularizou ainda mais. Porém,  devido a sua visão voltada ao público infantil, fez também com que ele se tornasse uma piada com o passar dos tempos. Em meados da década de 1980, porém, o personagem começou a recuperar seu lado mais sombrio e voltado para o público adulto, com a publicação de HQs como "Batman: Ano Um", "Batman: A Piada Mortal" e "Batman: O Cavaleiro das Trevas". O filme dirigido por Tim Burton e estrelado por Michael Keaton e Jack Nicholson também ajudou-o neste quesito. "Batman" tem um clima um tanto tenso, sendo fiel às histórias da época e tendo ótimas interpretações de seus astros. Não fosse pela trilogia de Christopher Nolan, este seria o meu preferido do homem morcego.

Homem-Aranha (Spider-Man, 2002)

Uma época um tanto quanto conturbada: o recente fracasso de "Batman & Robin" (bat-mamilos, anyone?) e o sucesso de "X-Men" confundiu as pessoas em questão às adaptações de heróis dos quadrinhos ao cinema. Mas este foi o filme que veio para colocar as coisas de volta no lugar. O "Homem-Aranha" de Sam Raimi trouxe ótimos efeitos, um bom elenco e uma história interessante das origens de um dos personagens mais queridos dos fãs de HQ. É emocionante em diversos aspectos, e também foi o responsável por popularizar a frase "com grandes poderes, vem grandes responsabilidades". Apesar de gostar do recente "O Espetacular Homem-Aranha", ainda considero este aqui melhor por vários motivos.

Batman: O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight, 2008)

Realista, sombrio, intenso, genial, repleto de ação. "Batman Begins" pode ter iniciado tudo, com sua abordagem extremamente realista, história bem feita (baseada em "Batman: Ano Um") e semelhança com algumas das melhores HQs do personagem, mas este aqui amadureceu tudo o que foi visto anteriormente e ainda adicionou mais elementos envolvendo tecnologia, dilemas morais e outras diversas coisas que só foram possíveis graças às mentes brilhantes e insanas de Christopher Nolan e seu irmão Jonathan. Fora, claro, as atuações de Christian Bale e Heath Ledger como os melhores Batman e Coringa já vistos nas telas (até o momento). "Batman: O Cavaleiro das Trevas" não é apenas uma das melhores adaptações já feitas, mas também um dos melhores filmes da história.

Os Vingadores (The Avengers, 2012)

Este filme é o mais puro deleite nerd. Um grupo de heróis, um elenco recheado de astros, um roteiro simples mas extremamente sólido, sequências de ação estonteantes, tiradas engraçadíssimas e um Robert Downey Jr. em ótima forma. Não interessa se "Homem de Ferro 2" não foi tão bom quanto o primeiro, se "Thor" e "Capitão América - O Primeiro Vingador" foram fracos e se mudaram o ator que interpreta o Hulk, "Os Vingadores" é simplesmente animal e te faz esquecer de tudo o que veio anteriormente. Se tem uma adaptação que merece ser vista como inspiração para as futuras, com toda a certeza é esta.

MENÇÕES HONROSAS:

X-Men (X-Men, 2000)

Como falei, "Homem-Aranha" veio para colocar as coisas no lugar, mas foi "X-Men" que deu novas esperanças aos fãs de heróis depois do fiasco de "Batman & Robin". Bryan Singer dirigiu uma adaptação muito boa do grupo de mutantes e que encantou a muitos quando foi lançada. Boa história, ótimos efeitos e um elenco com atores como Sir Ian McKellen, Sir Patrick Stewart, Hugh Jackman, Halle Berry e Famke Janssen, simplesmente não dá para não gostar. Uma pena que a franquia se perdeu em "O Confronto Final" e "X-Men Origens: Wolverine", mas se recuperou com o bom "X-Men: Primeira Classe". Estou no aguardo para ver o que vem em "Wolverine - Imortal" e "X-Men: Dias de um Futuro Esquecido".

Homem de Ferro (Iron Man, 2008)

As duas sequências são boas, mas não conseguem superar o primeiro filme. Ele traz uma ótima versão das origens de Tony Stark e sua transformação em Homem de Ferro, com uma boa dose de ação e um final de explodir a cabeça, além da trilha sonora com direito a músicas do AC/DC e do Black Sabbath. Foi também o longa que trouxe Robert Downey Jr. de volta a boa forma, depois de anos longe dos holofotes. E ainda por cima foi o que fez a Marvel iniciar seu ambicioso plano para "Os Vingadores", e, se não houvesse feito sucesso, provavelmente a excelente adaptação nem sequer existiria.

terça-feira, 9 de julho de 2013

CRÍTICA: Iron Maiden - Somewhere In Time [1986]


Antes de começar a análise, gostaria de explicar o porquê da minha escolha. O certo seria começar a seção de música com um lançamento atual, como "13" do Black Sabbath, "Random Access Memories" do Daft Punk ou o auto-intitulado do The Winery Dogs. Ao invés disso, escolhi um álbum antigo, lançado em 1986 pelo Iron Maiden, e que na época não foi o que pode se chamar de "um verdadeiro sucesso de crítica", apesar de ter um reconhecimento muito maior nos dias de hoje. O fato é que "Somewhere In Time" significa muito para mim: é o meu preferido dos ingleses, um dos primeiros que ouvi na vida, o primeiro CD que eu comprei e também a primeira crítica musical que escrevi na vida, em outubro de 2009, lá no Bar Obi-Wan. O problema é que aquele texto está defasado, com muitas repetições e nada de dinâmica. Há muito tempo queria reescrevê-lo, antes mesmo de encerrar as atividades do meu antigo blog, mas sempre esquecia e acabei deixando de lado. Recentemente, porém, eu o li novamente e pensei: "isso aqui precisa de uma reescrita URGENTE!". Então, nada mais justo do que fazê-lo aqui no Valar Morghulis, Valar Dohaeris.

Dadas as explicações, vamos ao que interessa. Voltemos no tempo, para o biênio 1984-1985. O Iron Maiden havia lançado "Powerslave", considerado por muitos uma obra-prima do Metal e o melhor disco do grupo até então. Com músicas fortes e concisas, como "Aces High" e "2 Minutes to Midnight", e uma performance ímpar, o registro conquistou headbangers do mundo todo. Prova disso foi sua turnê de divulgação, "World Slavery Tour", que contou com uma produção colossal e um público de mais de um milhão de pessoas no total de seus 187 shows, sendo que cerca de 300 mil estiveram presente na primeira passagem dos britânicos no Brasil, durante a primeira edição do Rock In Rio. Todo esse sucesso foi registrado no ao vivo "Live After Death". Estava mais do que claro que o Maiden havia se tornado um fenômeno mundial, e uma das maiores bandas da época. Se "The Number of the Beast" fez com que eles estourassem na mídia, foi com "Powerslave" que eles se consolidaram.

Terminada a longa tour, de 331 dias de duração, eles se perguntaram: "OK, estamos no topo. E agora?". Precisavam se superar, ou ao menos manter a qualidade do anterior. Bruce Dickinson veio com algumas  músicas acústicas, dizendo que precisavam de algo como "Led Zeppelin IV" ou "Physical Graffiti", ou então estagnariam e cairiam no esquecimento. Os outros integrantes negaram todas, e ficaram com as composições feitas pelo baixista e chefe Steve Harris e o guitarrista Adrian Smith. Resolveram então se focar na continuidade dos trabalhos anteriores, refinando ainda mais seu som pesado e muitíssimo bem trabalhado e adicionando um novo elemento: guitarras sintetizadas (que, ao contrário do que muitos pensam, não são aqueles teclados segurados como uma guitarra), o que o deixou mais futurista. Gravaram músicas com a temática comum "tempo-espaço", algo que não foi combinado segundo relatos dos próprios músicos, e contaram com a produção do renomado Martin Birch, que também trabalhou com eles em diversos outros  álbuns.

Assim surgiu "Somewhere In Time", o sexto registro de estúdio do Iron Maiden, lançado no dia 29 de setembro de 1986. Ele dividiu a crítica na época, com muitos elogiando a nova abordagem e muitos criticando-a por se distanciar do que foi ouvido anteriormente. De qualquer forma, foi um sucesso comercial, tendo ganho o Disco de Platina e vendido mais de um milhão de cópias apenas nos Estados Unidos. A sua turnê de promoção, "Somewhere On Tour", também teve um impacto positivo, passando pela Europa, América do Norte e Ásia, num total de 151 apresentações entre setembro de 1986 e maio de 1987.

"Tá, tudo isso é muito legal, mas o que esse disco tem de tão especial?" Simples: TUDO. A começar pela fantástica capa, uma verdadeira obra-prima do desenhista Derek Riggs. Ela traz o mascote Eddie como se fosse um ciborgue, em um ambiente futurista e distópico inspirado no excelente filme "Blade Runner", estrelado por Harrison Ford. Belíssima e cheia de detalhes, também traz diversas referências a elementos ligados à banda e seus gostos, como a lixeira vista ao fundo do primeiro álbum, um placar com o resultado "West Ham 7 x 3 Arsenal", Ícaro caindo, a TARDIS da série "Doctor Who"... Até mesmo o Batman está presente. Isso também se repetiu com as artes dos singles, também feitas por Riggs.

A arte completa de "Somewhere in Time", em uma resolução melhor.

Se a apresentação visual já é de cair o queixo, o conteúdo consegue superar. As músicas de "Somewhere In Time" são atemporais. Você pode ter ouvido-as na época do lançamento, pode ouvi-las hoje e pode ouvir daqui a mais 30 anos: elas nunca soarão antigas. Todas contam com excelentes letras e um instrumental arrebatador, que soa futurista e clássico ao mesmo tempo, com todos os elementos que elevaram o Maiden ao status de gigantes do Metal e a adição mais do que certeira das guitarras sintetizadas, que de certa forma os renovaram e trouxeram o clima perfeito às composições. Um verdadeiro trabalho de mestre do até então quinteto inglês, com total destaque ao vocalista Bruce Dickinson, em sua melhor performance de estúdio, e ao guitarrista Adrian Smith, que, além de seus ótimos riffs e sensacionais solos repletos de feeling, se mostrou mais uma vez um excelente letrista e compositor, sendo autor de ambos os singles lançados. Vale ressaltar também a excelente produção de Martin Birch, com uma mixagem limpa e bem feita até mesmo para os dias atuais.

O álbum começa com "Caught Somewhere In Time", com uma introdução lenta, mas que logo se torna rápida, pesada e apresenta solos incríveis da dupla Dave Murray e Adrian Smith. O single "Wasted Years" é uma das minhas músicas favoritas da história, graças a sua letra, instrumental e até mesmo o clipe. "Sea of Madness" merecia mais destaque, devido ao seu equilíbrio entre o peso e a melodia, especialmente em passagem mais lenta na metade de sua duração. "Heaven Can Wait" se assemelha bastante com o que foi produzido anteriormente (especialmente em "The Number of the Beast"), e é uma das poucas de "SiT" tocadas ao vivo até hoje. "The Loneliness of the Long Distance Runner" tem um ritmo frenético, assim como uma corrida, e é possível até mesmo sentir toda a necessidade do eu lírico de vencer a competição. Uma canção sem igual em toda a discografia do grupo.

"Stranger in a Strange Land", o segundo single, dá uma desacelerada no disco. Não chega a ser uma balada, mas é mais cadenciada, com uma melodia sensacional e mais uma performance de destaque de seu autor, Adrian Smith. Ela fala sobre um explorador que morreu no Ártico e teve seu corpo encontrado apenas 100 anos depois, além de trazer um sentimento de saudades de seu local de origem. Seguindo adiante, temos "Deja-vu" que, apesar da excelente letra, apresenta o instrumental mais fraco do registro. Não me entendam mal: ela é ótima , mas muito inferior se comparada com as demais. A última música, "Alexander The Great", encerra da melhor maneira possível. Um verdadeiro épico, muito pedida ao vivo até hoje e considerada por muita gente a melhor do Iron Maiden. Conta sobre a vida do conquistador Alexandre, o Grande, e é impecável em todos os seus aspectos. Todos os integrantes merecem destaque pelo seu desempenho perfeito nela.

A qualidade de "Somewhere In Time" é tamanha que também não posso deixar de comentar os B-Sides dos singles. De "Wasted Years", temos a excelente "Reach Out", que conta com o guitarrista Adrian Smith no vocal e que também foi escrita por ele, e "Sheriff of Huddersfield", que é na verdade uma zoação com o empresário Rod Smallwood, que não conseguia se adaptar a Los Angeles e estava sempre reclamando. "Stranger in a Strange Land", por sua vez, trouxe "That Girl", belíssima música que até hoje não se sabe se é um cover da banda FM ou se Smith esteve envolvido com a composição e resolveu gravá-la, e "Juanita", divertida canção que é um cover do Marshall Fury.

Se "Somewhere In Time" não foi extremamente aclamado na época de seu lançamento e dividiu opiniões, hoje não se pode dizer o mesmo. Atualmente tem total reconhecimento dos fãs, que imploram para o atual sexteto tocar mais de suas músicas ao vivo, especialmente "Alexander The Great". Talvez seja injustiçado, por não ter o merecido destaque dentre os lançamentos do grupo. Mas pode ter certeza: não é por ser ruim. Pelo contrário, é um dos melhores álbuns de Metal da história. Sua sonoridade fantástica, o equilíbrio entre o peso e a melodia, músicas bem trabalhadas, letras inspiradoras, arte da capa... Como eu disse, tudo é especial nele. Junto com "Powerslave" e "Seventh Son of a Seventh Son", compõe o que chamo de "Santíssima Trindade", também conhecido como "The Golden Years". É o melhor que o Iron Maiden tem a oferecer, e com toda certeza é o meu preferido.

NOTA: 9,5

Bruce Dickinson - vocal
Steve Harris - baixo, baixo sintetizado, backing vocal
Adrian Smith - guitarra, guitarra sintetizada, backing vocal
Dave Murray - guitarra, guitarra sintetizada
Nicko McBrain - bateria

TRACKLIST:
1. Caught Somewhere In Time
2. Wasted Years
3. Sea of Madness
4. Heaven Can Wait
5. The Loneliness of the Long Distance Runner
6. Stranger in a Strange Land
7. Deja-vu
8. Alexander The Great

SINGLES:


sexta-feira, 5 de julho de 2013

Fanáticos

Chegou exausto do trabalho. Foi um dia matador: muita papelada e dezenas de clientes. Muitos deles não entendiam o que tentava explicar, o que o fez repetir muitas vezes a mesma coisa até que compreendessem. E aquele chefe que não saía do seu pé? Não podia nem olhar pro lado que já vinha pressionar, perguntando por que não estava trabalhando pesado e ameaçando reduzir seu salário. Geralmente não era assim, mas hoje ele estava marcado. Talvez aquele falastrão do andar de baixo tenha dito alguma besteira... Fora o trânsito atípico. E ele morava a 10 quadras de onde trabalhava, mas teve que pegar seu carro porque saiu atrasado.

Para alguém de apenas 27 anos, ele estava bem financeiramente. Tinha um bom emprego, ganhava bem, e já ocupava um cargo um tanto elevado na empresa. Havia recém comprado um belo carro zero, e morava sozinho em um espaçoso apartamento alugado. Mas sentia-se solitário. Uma briga recente com a namorada fez com que eles terminassem o relacionamento de quase um ano. Estava muito chateado e confuso, pois gostava muito da garota, porém sabia que aquele era o fim. Ela era ciumenta demais, e ele queria um pouco mais de liberdade em sua vida. Tentaram fazer dar certo de todos os jeitos possíveis, só que o fim era inevitável, e o conflito cada vez mais iminente. Foi terrível quando ocorreu, realmente sem volta. 

Tentando desviar sua mente daquilo tudo e relaxar um pouco, chamou alguns amigos para ir até sua residência naquela noite. Bater um papo, falar algumas besteiras, tomar umas cervejas. Por que não? Aquilo seria o máximo de diversão que ele teria em semanas. E era quarta-feira, ou seja, dia de futebol. Seu time jogaria uma partida difícil na disputa pela primeira colocação do campeonato. Cenário melhor para poder descontrair e até mesmo liberar um pouco de sua raiva, impossível.

Preparou alguns petiscos e colocou a bebida no freezer. Deu uma arrumada básica no local, viu se estava tudo em ordem e foi finalmente colocar uma roupa mais confortável, coisa que deveria ter feito logo quando entrou em casa. Olhou no relógio. Ainda tinha quase uma hora até que o jogo começasse, então decidiu ver algumas coisas na internet. Abriu uma rede social e... nada de interessante, apenas o lixo de sempre. No site de notícias, só coisas fúteis. Em blogs de humor, nenhum post engraçado. Desligou o computador e foi fazer algo que não fazia há tempos: assistir televisão.

Sentou-se no sofá, pegou o controle e ligou o aparelho. Mudou algumas vezes de canal até encontrar algo que lhe chamou a atenção: um show. Não era de nada que gostasse, e sim da boyband do momento. O que o fez parar ali, porém, não foi o som, e sim o público. No caso, composto em sua grande maioria por garotas adolescentes, que gritavam de forma estérica, seguravam cartazes, se esmagavam num espaço que parecia pequeno para as milhares delas, e tentavam ficar o mais próximas possível dos artistas. Ele simplesmente não entendia aquilo. Já esteve em alguns shows, claro, mas nunca tinha visto uma situação como aquela. Não fazia sentido, especialmente porque os caras não eram nem de longe bonitos. E as músicas, putz...

Trocou de canal. Lá se deparou com outra cena inusitada: uma passeata de religiosos. Centenas de pessoas andando nas ruas, com faixas e gritos de guerra com mensagens religiosas. Trocou novamente. Dessa vez, era um programa onde dois jovens obesos discutiam as vantagens de seus video-games preferidos e qual era o melhor. Em muitos momentos, quase trocaram socos, enquanto a platéia ia a delírio e incentivava. Trocou mais uma vez. Imagens de militantes de partidos políticos na tela, todos com suas bandeiras, cartazes e camisetas, exaltando figuras públicas. Ele detestava política, então não hesitou em desligar a televisão e foi até a cozinha.

Não conseguia entender as situações que havia acabado de ver. "Por que tanta gente quer mostrar sua admiração por algo sem motivo algum? É muita falta do que fazer...", pensou. Para ele, nada daquilo tinha sentido. Resolveu então deixar para lá e se dedicar aos seus afazeres, pois o pessoal já estava para chegar. Tirou as bebidas do freezer, levou os petiscos para a sala. Deu uma desamassada no tapete e endireitou um pouco a poltrona. Ligou novamente a televisão e colocou no canal que transmitiria o jogo. Ainda não tinha começado, mas já estava quase na hora.

O interfone tocou. Ele atendeu e mandou subir. Instantes depois, bateram em sua porta. Os amigos finalmente chegaram, e estavam todos uniformizados com a camisa do time. Cumprimentou a todos, falou para se acomodarem e foi colocar a cerveja que trouxeram no freezer. Enrolou as garrafas com papel toalha molhado para elas gelarem mais rapidamente, como viu outro dia na internet. Voltou para a sala e viu que levaram até uma bandeira com o escudo da equipe. Gostou, apesar de ter achado um pouco exagerado. Mas sua atenção se desviou para a tela, pois os jogadores já entravam em campo.

Quando a bola finalmente rolou, ele teve uma sensação boa. Pode finalmente extravasar aquele sentimento que vinha sentindo há semanas. Torceu como nunca antes na vida. Vibrou com cada ataque, suspirou aliviado a cada lance de perigo desperdiçado pelos adversários. Xingou o juiz dos piores nomes possíveis, nem a mãe do cidadão foi poupada. Quase jogou o controle remoto na televisão. Gritou. Pulou. Cantou o hino do time. Até pegou a bandeira dos amigos e a pendurou na varanda.

Não percebeu, mas agia quase como aquelas garotas do show. Ou as pessoas na passeata religiosa. Ou os gordos que discutiam qual video-game era melhor. Ou os militantes de partido político.

O time venceu o jogo. E ele se sentia bem, melhor do que esteve em muitas semanas. Estava feliz. Sem nenhum motivo aparente.

terça-feira, 2 de julho de 2013

Jim Carrey, Kick-Ass e a Violência nas HQs (e em outras mídias)


Alguns acompanharam nos últimos dias a polêmica envolvendo Jim Carrey e seu mais recente filme, "Kick-Ass 2", que será lançado dia 16 de agosto nos EUA e 13 de setembro aqui. O ator, que se tornou contra o uso de armas após o massacre na cidade de Newton em dezembro do último ano, tweetou que não divulgaria mais a adaptação por não suportar o nível da violência presente nela, e que os acontecimentos recentes mudaram seu ponto de vista (detalhe: ele gravou um mês do incidente). A declaração causou confusão em muitos, especialmente pelo que foi visto nos trailers e materiais promocionais: um Carrey caoticamente divertido como Colonel Stars and Stripes.

Um desses muitos foi ninguém menos que Mark Millar, autor dos quadrinhos que serviram como base para a película e de outras obras como "Superman: Red Son", "Nemesis" e "Jupiter's Legacy". Em um texto escrito nos fóruns de seu site "MillarWorld", ele se mostrou extremamente surpreso com a ação, especialmente após todo o entusiasmo demonstrado pelo ator e seu trabalho sensacional nesta sequência, a qual Millar por questões óbvias já assistiu diversas vezes. Elogiou-o de diversas formas, mas explicitou que seu objetivo jamais foi promover a violência, e sim mostrar suas consequências nas vidas dos envolvidos. Claro que a contagem de corpos terá um número elevado, mas não há como fugir disso, pois faz parte de sua "arte".

Quem já leu alguma de suas publicações sabe muito bem que isso é verdade. "Kick-Ass", por exemplo, é intenso, polêmico e até "Tarantinesco" na questão da sanguinolência. Se você acha que o filme é politicamente incorreto, saiba que a história original é extremamente mais, com muito mais palavrões, mortes, cenas de tortura e até mesmo uma Hit Girl que chega a usar substâncias ilícitas para melhorar seu "desempenho", além de ser muito mais desbocada. "Nemesis" também deve ser citada, pois beira (se não extrapola) o absurdo, por contar com tantas cenas violentas e questões polêmicas que envolvem os limites da moral e ética de seus personagens. Para os que não conhecem, pensem: o que aconteceria se o Coringa tivesse a fortuna do Batman? É isso, e é insano.

Mas, como o próprio criador disse, elas mostram as consequências da violência. OK, em "Nemesis" nem tanto, pois, apesar do propósito de vingança do vilão/protagonista, a matança é generalizada e um tanto sem propósito. "Kick-Ass" (que é o foco aqui), porém, demonstra isso muito bem. Não dá para se tornar um herói e não se preocupar com as pessoas mais próximas, mas Dave Lizewski, o Kick-Ass, não pensa nisso no início, tanto é que, enquanto conta sua história, ele diz: "With no powers comes no responsability. Except, *that* wasn't true.", parodiando à famosa frase dita por Tio Ben no primeiro Homem-Aranha (2002). E o que acontece? Familiares, amigos e conhecidos de todos os envolvidos são mortos ou agredidos, seja pelos vilões, que resolvem fazer uma caçada aos mascarados, ou pelos heróis, que em um momento se veem combatendo o crime e em outro precisando se vingar de suas perdas e salvar sua própria pele. É um ciclo vicioso que, apesar de parecer legal nas histórias em quadrinhos de personagens como o Batman ou o Homem de Ferro, não tem como dar certo sem causar estragos na vida real.

Outro ponto ressaltado pelo próprio Millar é que tudo não passa de uma obra de ficção, e o propósito é entreter um público que paga para ver isso e que, devido a classificação etária para maiores de 18 anos (ou 16 em alguns poucos países), é um tanto quanto restrito. Mais do que isso: espera-se que eles entendam que  tudo não passa de atuação e tenham em mente os conceitos do que é certo e do que é errado. Sendo assim, não há justificativa para dizer que a adaptação incentive a violência ou o uso de armas. Caso contrário, haveria assassinos e terroristas a cada esquina.

Claro, há sempre quem tente relacionar, especialmente na mídia, violência com filmes, além de séries, quadrinhos e, o favorito de todos eles, video-games. Principalmente quando o caso é algum massacre, como o do colégio de Columbine em 1999, o do cinema no Colorado ou o próprio em Newton, que ocorreram em 2012. Vale lembrar, porém, que todos os ataques partiram das mãos de pessoas traumatizadas, com algum tipo de distúrbio, sempre isoladas, sozinhas e que geralmente guardam rancores do passado. Suas mentes funcionam de uma forma diferente, e, sendo assim, uma mera representação de cena violenta pode ser o estopim para realizar um ato tão terrível quanto os citados acima. (e não, não sou um especialista no assunto, mas já li algumas coisas a respeito. Qualquer correção a ser feita pode ser reportada na área de comentários)

Não há como tirar méritos de uma obra apenas por ela ser violenta. Pelo contrário: muitas das consideradas "as melhores" tem a violência presente. Ela faz, afinal, parte da vida de todos (de forma direta ou indireta) e também da história da humanidade. Não há nada de errado em retratar algo que existe no mundo, especialmente se também mostrar por que ele é ruim. Citando apenas alguns filmes, temos "O Poderoso Chefão", "Scarface", "Os Bons Companheiros", "Laranja Mecânica", "Clube da Luta", "Pulp Fiction" e "Taxi Driver", citados por muitos como o que Hollywood tem a oferecer de melhor. No caso dos quadrinhos, apenas histórias consagradas como "Watchmen", "V de Vingança", "Sin City", "300 de Esparta" e "Batman: A Piada Mortal". (NOTA: todas escritas ou por Alan Moore ou por Frank Miller)

Eu adoro o Jim Carrey. Para mim, é um dos melhores atores que já pisou na Terra. Um verdadeiro mestre da comédia, com atuações memoráveis em "Todo Poderoso", "O Máskara", "O Grinch", "Débi & Lóide", "O Mentiroso", "Ace Ventura", "Eu, Eu Mesmo e Irene" e muitos outros; além de ser muito versátil, o que ficou comprovado em "Cine Majestic", "O Show de Truman" e, especialmente, "Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças". Mas, assim como Mark Millar, espero que ele reconsidere suas motivações e não deixe de promover o filme. Violência fictícia não justifica a violência real, muito pelo contrário. Se não quiser voltar atrás, tudo bem, contanto que não seja hipócrita e doe o cachê ganho para uma organização anti-armas. Enquanto isso, apenas aumenta minha expectativa de assistir "Kick-Ass 2"...

Aos curiosos, estes são os tweets originais do Jim Carrey: AQUI e AQUI. E este AQUI é o texto original do autor Mark Millar. Tirem suas próprias conclusões e, se precisarem, comentem.